Governo reduz exigência para vender Confins

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Autor(es): SÍLVIO RIBAS » PAULO SILVA PINTO

Medo de fiasco levou o Planalto a mudar regras dos leilões que entregarão à iniciativa privada a administração dos aeroportos do Galeão, no Rio, e de Confins, em Belo Horizonte. No caso do terminal mineiro, o lance inicial da privatização foi reduzido de R$ 1,56 bilhão para R$ 994 milhões

Programa de concessões de infraestrutura vem sendo marcado por mudanças constantes de regras, devido ao desconhecimento dos responsáveis pelo modelo, à visão ideológica e à disputa de poder. Exigências para aeroporto mineiro diminuem

A sucessão de atropelos e de fiascos que vem marcando o programa de concessões de infraestrutura não deixa mais dúvidas sobre a dificuldade do governo de Dilma Rousseff de levar adiante um plano que é considerado essencial para tirar a economia da estagnação e ampliar a competitividade do país. O mais novo exemplo de um modelo marcado pela ideologia e por disputas de poder veio ontem, com o anúncio de novas mudanças nas regras para a privatização do aeroporto de Confins, em Minas Gerais. Antes, exigia-se que o futuro operador privado tivesse experiência na administração de terminais com movimento de 35 milhões de passageiros por ano. Agora, o número baixou para 20 milhões. No caso do Galeão, no Rio de Janeiro, a exigência foi mantida. Mas não é só: a licitação de ambos, prevista para 31 de outubro, foi remarcada para 22 de novembro.

Segundo o ministro da Secretaria de Aviação Civil (SAC), Wellington Moreira Franco, os ajustes foram feitos para atender um questionamento do Tribunal de Contas da União (TCU). No último dia 11, o órgão de controle aprovou, com ressalvas, os estudos técnicos usados pelo governo para montar os editais de concessão dos aeroportos. Em agosto, o Palácio do Planalto já tinha mudado os valor dos lances mínimos. No Galeão, subiu de R$ 4,65 bilhões para R$ 4,73 bilhões e, em Confins, recuou de R$ 1,56 bilhão para R$ 994 milhões.

Ansiedade
No entender dos analistas, os constantes recuos, retificações e adiamentos nos programas de rodovias, ferrovias, portos e aeroportos decorrem do desconhecimento técnico sobre as áreas concedidas, dos ranços ideológicos e da ansiedade para inaugurar canteiros de obras com vista às eleições de 2014. Em meio a tudo isso, ainda prosperam desperdício de recursos públicos e disputas entre autoridades com um único objetivo: chamar a atenção de Dilma e poder difundir na Esplanada que têm trânsito livre com a chefe.

“Esse colapso gerencial custa muito caro ao país”, disse Renato Fragelli, professor da Fundação Getulio Vargas (FGV-RJ). Para ele, a crescente desconfiança gerada pela falta de clareza nas propostas das concessões, pelos erros de projeções oficiais e pelas constantes revisões de editais, uma vez que o governo insiste em tabelar o lucro dos investidores, é a causa do insucesso do programa de Dilma. “O governo deveria tratar o capital privado como um sócio desejado, mas faz tudo errado e cerca o investidor de incertezas”, resumiu. No entender dele “está evidente a contrariedade com que a presidente Dilma e a ministra Gleisi Hoffmann (Casa Civil) estão conduzindo as concessões, forçadas pela falta de recursos no Orçamento para investir”.

O ápice das contradições do governo foi o duelo entre Bernardo Figueiredo, presidente da Empresa de Planejamento e Logística (EPL), criada para coordenar o setor de infraestrutura de transportes no país, e Arno Agustin, secretário do Tesouro. Hoje, a estatal está relegada ao ostracismo, apesar de manter uma estrutura com mais de 150 funcionários para não fazer quase nada.

Na avaliação de Fragelli, os equívocos do modelo ficaram evidentes na semana passada com a falta de candidatos à BR 262 (ES/MG) e a vitória de um grupo desconhecido no leilão da BR 050 (GO/MG). Segundo ele, há o risco de o leilão do Campo de Libra, no pré-sal da Bacia de Campos (RJ), ir pelo mesmo caminho. “Temo pela vitória de um consórcio fictício, com o BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) por trás”, afirmou, destacando que os estrangeiros temem pagar adiantado R$ 11,5 bilhões para explorar o petróleo com registros incertos, tendo do lado a sócia Petrobras e a fiscal PetroSal. O ministro Edison Lobão (Minas e Energia) avisou ontem que o governo não fará aportes na estatal para competir por Libra.

Raul Velloso, especialista em gestão pública, acredita que as concessões empacaram por causa do “viés político equivocado” e da “incompetência nos níveis técnicos, nos quais há gente muito despreparada”. O primeiro obstáculo, acredita, é a busca exagerada por tarifas baixas. “Mesmo que algumas pessoas no governo não pensem dessa maneira, as que pensam predominam. As outras ficam quietas para manter o emprego”, destacou.

Corrupção
O economista lamenta que etapas importantes estejam sendo queimadas e acredita que a EPL levará tempo para formar um corpo técnico capaz de eliminar empresas sem condições de operar com as concessões. Só para elaborar o projeto básico do Trem de Alta Velocidade (TAV), que acabou sendo adiado para 2014, já foram gastos R$ 1 bilhão. “As grandes empresas têm desistido dos leilões porque o setor privado não entra em um negócio em que não possa ter lucro. Quem entra são os novatos, por desconhecimento ou porque esperam contar com a benevolência do governo mais tarde, caso não cumpram os prazos dos investimentos”, afirmou Velloso.

Ontem, além das mudanças na concessão de Confins, o governo confirmou que readequará a estatal Valec, sinônimo de corrupção, para atuar no novo modelo de concessão de ferrovias. A ideia é realizar pelo menos um leilão desse modal em 2013, afirmou o ministro dos Transportes, César Borges. Segundo ele, nos próximos dias, será encaminhada ao Congresso, via medida provisória ou projeto de lei, proposta de transformação da estatal na Empresa Brasileira de Ferrovias (EBF), que comprará 100% da capacidade de tráfego das ferrovias a serem licitadas. Nesse sentido, já foram injetados R$ 15 bilhões no caixa da Valec. Segundo analistas, a mudança visa também permitir à empresa contratar serviços para construir linhas não absorvidas pela iniciativa privada.