Brasil do Orçamento impositivo deixa 51% das cidades sem verba de emenda

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Autor(es): Daniel Bramatti Diego Rabatome

As cidades de Frei Paulo e Campo do Britto, interior de Sergipe, ficam a menos de 30 km uma da outra. Ambas têm 15 mil habitantes e economia baseada na agricultura, na pecuária e no comércio. A primeira exibe em suas mas várias placas de investimentos federais. Já a segunda comemora quando consegue pagar os funcionários em dia.

A distorção tem explicação. Nos últimos três anos, Frei Paulo foi alvo de 20 emendas parlamentares federais. Campo do Britto, de nenhuma. Essa distorção seria maior se todos os recursos fossem de fato liberados, algo que poderá ocorrer caso o projeto de Orçamento impositivo, que torna obrigatório o pagamento das emendas parlamentares, seja aprovado e passe a valer no ano que vem.

Levantamento do Estadão Dados com todas as 24.448 emendas apresentadas pòr deputados e senadores nos últimos três anos mostra que, se o Orçamento impositivo estivesse em vigor desde então, a totalidade dos repasses via emenda seria embolsada por menos da meta-; de das prefeituras do País.

Dos 5.570 municípios brasileiros, 2.719 (49%) aparecem como beneficiários de emendas, nos Orçamentos de 2011,2012 e 2013. Ôs demais 2.851 (51%), sem “padrinhos” e combaixa influência política, foram desconsiderados pelos parlamentares.

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Nos últimos três anos, as emendas parlamentares totalizaram R$ 25,5 bilhões, sendo R$ 6,4 bilhões reservados para municípios e o restantes para programas nacionais, governos estaduais e organizações não-governamentais.

O volume de recursos que os parlamentares vão controlar com o Orçamento impositivo não será nada desprezível. O valor do conjunto de suas eriien-
cns, segundo a proposta de emenda à Constituição que tramita no Congresso, será equivalente a 1% da receita corrente líquida da União (o total de impostos arrecadados menos as transferências obrigatórias) registrada no ano anterior.

Em 2013, a previsão do governo é que a receita líquida chegue a R$ 700 bilhões. Com isso, no ano eleitoral de 2014, o Congresso terá R$ 7 bilhões em emendas para liberar, caso o Orçamento impositivo seja aprovado. Cada deputado e senador contará com um “cheque” de R$ 12 milhões para atender a seus redutos eleitorais,

j Distritalização. Em termos políticos, o Orçamento impositivo vai reforçar a tendência de distritalização do voto – eleitores apoiam o candidato de sua região na expectativa de que isso traga benefícios localizados. Para alguns cientistas políticos, esse é um fator positivo, pois reforça os vínculos entre representante e representado. Para ; outros, há risco de que os deputados se transformem em “Vereadores federais” ao priorizar redutos, deixando em segundo plano questões nacionais que transcendam fronteiras.

Outro possível efeito será o aumento da taxa de reeleição dos parlamentares – os R$ 50 milhões para bancar obras ao longo de quatro anos funcionarão como financiamento público de campanha permanente.

As relações entre Executivo e Congresso também serão afetadas. E comum a liberação de recursos de emendas como moeda de troca por apoio político.

O governo costuma abrir os cofres quando precisa arregimentar votos para projetos que considera importantes. É comum que os parlamentares mais fiéis aos interesses do Palácio do Planalt

o tenham mais dinheiro de emendas liberado para a execução de obras.
Redistribuição. Em termos econômicos, o Orçamento impositivo terá efeito redistributi-vo em nível nacional, ao mandar mais recursos para Estados : das regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste. Isso acontecerá porque estas regiões são super-representadas no Congresso -têm mais deputados e senadores por habitante que as mais ricas regiões Sudeste e Sul

Em nível local, porém, o efeito será concentrador. As cidades maiores, que em geral são também as mais ricas, elegem mais representantes e são beneficiárias de mais emendas. As menores e mais pobres tendem a ficar em segundo plano.

Se o Orçamento impositivo estivesse em vigor nos últimos três anos, o ranking de repasses, em valores absolutos, seria encabeçado por capitais e outros municípios com grande peso populacional e econômico.

Nas 100 primeiras posições, as cidades teriam população média de 680 mil habitantes. Na posição número 63, a sergipana Frei Paulo seria um dos raros “grotões” na lista dos 100 maiores beneficiários, com R$ 16 milhões em três anos.

Levando-se em conta os repasses per capita, cada habitante da cidade teria recebido o equivalente a R$ 1.150, o que a colocaria no topo do ranking. Nao porque sua população seja mais necessitada de recursos federais, mas porque ela conta com bons padrinhos políticos.