Gasto discricionário terá forte aumento no fim deste ano

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Em meio a uma recessão que ainda não dá sinais de acabar, o governo vai acelerar fortemente seu gasto fiscal neste fim de ano. Depois de passar o ano inteiro segurando a despesa discricionária, aquela que tem livre destinação pelo Poder Executivo, nos dois últimos meses de 2016 o gasto nessa rubrica promete disparar. Com isso, de acordo com os dados do próprio Tesouro Nacional, esse grupo de gastos sairá de uma queda real de quase 7% de janeiro a outubro para uma expansão de mais de 4% acima da inflação. Uma das principais causas desse movimento se deve à estratégia de redução de restos a pagar de outros anos, aproveitando­se da receita extraordinária gerada pelo programa de repatriação. Mas, independentemente disso, o movimento significa uma injeção forte de recursos na economia brasileira no fim do ano. O governo projeta que o gasto discricionário encerre o ano em R$ 281,8 bilhões, ante R$ 253,3 bilhões em 2015. Para se ter uma ideia do nível de aceleração do gasto fiscal neste fim de ano, a média mensal na despesa discricionária passará de R$ 21 bilhões para a casa dos R$ 35 bilhões. “A se concretizar esse número, o impacto certamente é expansionista na economia. A empresa usa o dinheiro [recebido do governo] para pagar os funcionários, os fornecedores e viabiliza que ela pague impostos”, disse um ex­integrante do governo. “Mas acho difícil reverter o PIB nesse quarto trimestre por conta da questão dos Estados e da incerteza política e câmbio”, acrescenta a fonte, lembrando ainda que está faltando ajuda mais efetiva do Banco Central, reduzindo juros. Fontes da equipe econômica argumentam que a disparada do gasto neste fim de ano não teria caráter tão expansionista quanto parece. Alegam que, dado que a maior parte do dinheiro irá para colocar em dia o pagamento de obras já realizadas, o grande impacto econômico das iniciativas ficou no passado. Embora as fontes reconheçam que haverá aumento do dinheiro em circulação na economia, dizem que o impacto é baixo e difícil de se estimar porque não se sabe qual será o destino desse recurso quando empresas e pessoas o receberem. Boa parte dos pagamentos que o governo fará neste fim de ano será nos investimentos. Só de restos a pagar do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), as estimativas iniciais eram de cerca de R$ 10 bilhões. Empresas de construção civil são as maiores beneficiadas. A economista da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) Margarida Gutierrez aponta que esse forte crescimento das despesas no fim do ano é “algo específico desse período”, com o pagamento de obrigações assumidas anteriormente. “É uma coisa boa, porque vai eliminando passivos que significam comprometimento de caixa, que viram restos a pagar, e há um acúmulo de restos a pagar que tem de tirar do orçamento”, explicou. 

Por outro lado, ela lembra que a forte entrada de dinheiro na economia é mais um dos vários sinais de que, até o momento, o ajuste fiscal pregado pelo governo federal não passa de um discurso sem contato com a realidade. “O ajuste fiscal ainda não começou. A política fiscal é expansionista. Um déficit que vai aumentar, os gastos do governo estão aumentando, então, cadê o ajuste fiscal? Por qualquer critério, você está expandindo a demanda agregada.” Já o economista­chefe da Sul América Investimentos, Newton Rosa, lembra que a maioria desses gastos discricionários é investimento, “que por sua vez já tem sido cortado nos últimos anos e está no osso, não tem carne e muito menos gordura para cortar”. “A contenção vai até um limite”, resume Rosa. “Muitos desses desembolsos estão aí para pagar esses gastos com obras, sem criar restos a pagar para o próximo ano. A questão toda é saber até que ponto isso está dentro da projeção do déficit para este ano”, diz ele. Rosa avalia que a repatriação de recursos não declarados no exterior deu mais conforto para que o governo atinja a meta de déficit e “tenha algum alívio para que possa fazer algum dispêndio na área de investimento”. “Isso acaba ajudando [a economia] nesse aspecto, embora não seja isso que vá tirar a economia do marasmo”, pontuou. O economista ­chefe da Gradual Investimentos, André Perfeito, avalia que a natureza do “descontrole fiscal atual” está mais na queda abrupta das receitas do governo, apesar do crescimento da despesas ao longo dos anos. “Nesse sentido, vejo que a única forma de tentar “controlar” o déficit primário seria alguma elevação dos impostos, algo que não está no radar ainda ­ só vão tocar nesse assunto depois e aprovada definitivamente a PEC do teto de gastos”, comenta. Na visão dele, o principal problema de resultados fiscais ruins será na dinâmica dos juros. “Com déficits ainda grandes, os modelos dos economistas irão persistir em inflação elevada e [isso] fará o BC ser mais modesto no corte de juros”.