A greve da magistratura

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O Estado de S. Paulo – 08/11/2012

 

 

Juízes federais e trabalhistas de todo o País não trabalharam ontem e continuarão parados hoje, para protestar contra a situação salarial da categoria e reivindicar um reajuste de 28,86%. Como o acesso aos tribunais é uma garantia fundamental e a magistratura não pode fazer greve, sob pena de violar liberdades públicas asseguradas pela Constituição, os juízes federais e trabalhistas classificaram a suspensão de suas atividades por 48 horas como “dias de mobilização”. Em novembro de 2011, as duas corporações fizeram uma paralisação de um dia. Só a Justiça do Trabalho teve de remarcar 20 mil audiências.

Além de suspender suas atividades, os juízes federais e trabalhistas decidiram boicotar a Semana Nacional de Conciliação, promovida pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que vai até o próximo dia 14. Essa é uma das mais importantes iniciativas que o CNJ vem tomando desde sua instalação, em 2006, para descongestionar a primeira e a segunda instâncias do Poder Judiciário. O evento do ano passado contou com a participação de 53 tribunais e, das 339 mil audiências de conciliação realizadas, 164 mil resultaram em acordos homologados pela Justiça, no valor total de R$ 1,1 bilhão.

As seccionais da OAB alegaram que o protesto das magistraturas federal e trabalhista é inconstitucional, além de condenável, no plano ético, por “causar prejuízo à população em véspera de Natal”. Para os dirigentes da Associação dos Juízes Federais (Ajufe) e a Associação Nacional dos Magistrados do Trabalho, inconstitucional é o tratamento salarial que estaria sendo dado aos 5,5 mil integrantes das duas corporações.

“A independência da magistratura passa por uma remuneração condigna, prevista pela Constituição”, diz o presidente da Ajufe, Nino Toldo. “A Constituição garantiu a irredutibilidade dos salários e não o fez por acaso. O objetivo era garantir a estabilidade dos vencimentos. Não é possível continuar nessa situação”, afirma o presidente da Anamatra, Renato Sant”Anna, pedindo a reposição das perdas inflacionárias e alegando que 50% dos juízes trabalhistas estariam “vivendo com créditos consignados”.

Além de reivindicar reajuste salarial, os juízes federais e trabalhistas reclamam da ausência de progressão funcional na carreira e pleiteiam a criação de um Adicional por Tempo de Serviço. Segundo eles, a distância entre os salários de quem ingressou na magistratura e de quem está se aposentando é muito pequena. “A desvalorização da carreira é preocupante. Os juízes não podem ter outra fonte de renda, a não ser um cargo de professor. Ao contrário de outros servidores públicos, os magistrados não têm direito a compensações”, diz o presidente da Ajufe, lembrando que os dirigentes do Poder Executivo recebem compensações indiretas para aumentar seus vencimentos, integrando conselho de empresas estatais.

Durante o processo de elaboração do orçamento, o governo reservou recursos para conceder o reajuste de 15,8% a todo o funcionalismo federal, durante os próximos três anos. Os juízes protestam, lembrando o princípio da autonomia financeira do Judiciário, criticando as prerrogativas do Executivo em matéria orçamentária e acusando os responsáveis pelo Orçamento da União de minar “uma política adequada de valorização” da magistratura federal e trabalhista. Eles também acusaram o Executivo de não ter encaminhado ao Congresso a proposta salarial apresentada pelo Supremo Tribunal Federal em 2011 e de criar dificuldades para o pagamento de créditos e benefícios funcionais da magistratura federal e trabalhista.

As pretensões e reclamações das duas corporações, contudo, não são procedentes. Como já lembraram os técnicos do Ministério do Planejamento, os tribunais já pagam os maiores salários do funcionalismo público. Além disso, o CNJ divulgou estudo mostrando que o Judiciário é uma instituição inchada, com um quadro de pessoal maior do que o necessário. Por fim, os juízes se esquecem de que, apesar de os Poderes serem independentes, o cofre é um só e a responsabilidade sobre o que entra e sai é do Executivo.