Descrédito da política fiscal
Ao aprovar, com ressalvas, as contas do segundo ano do governo Dilma, o Tribunal de Contas da União (TGIJ) advertiu para a deterioração da política fiscal e para o risco de as demonstrações contábeis e financeiras ficarem ainda mais desacreditadas. Por causa das manobras utilizadas pelo governo para alcançar o superávit primário que tem anunciado, nem mesmo o órgão incumbido de fiscalizar a aplicação dos recursos da União consegue aferir com precisão qual é seu real valor, como admitiu o relatório do TCU.
O uso dessas manobras, advertiu em entrevista o autor do relatório, ministro José Jorge, pode desmoralizar o superávit primário – que indica a capacidade do governo de honrar a dívida pública e, por isso, é importante indicador de austeridade financeira apresentado pelas autoridades, tornando-o algo parecido com a inflação anunciada pelo governo argentino, na qual ninguém acredita. Seria uma forma de “argentinização” das contas públicas brasileiras.
De acordo com o relatório, nos últimos anos “mudanças metodológicas e transações atípicas cada vez mais complexas” tornaram o acompanhamento e a fiscalização do superávit primário “um verdadeiro desafio” para todos, inclusive para o TCU. “Supostos ganhos” que resultarem dessa prática, advertiu ainda o relatório, “podem ser suplantados pela perda de credibilidade do indicador”, pois, por mais criativas e complexas que sejam as manobras contábeis, “elas acabam sendo identificadas e quantificadas pelos demais agentes do mercado, que passam a desconfiar da real capacidade do governo de obter tal resultado”.
Nos últimos três dias do ano passado, para engordar artificialmente o superávit primário do exercício fiscal, o governo Dilma sacou R$ 12 bilhões do Fundo Soberano do Brasil, criado para ser utilizado em períodos de dificuldades econômicas, e antecipou R$ 7 bilhões de dividendos que deveria receber da Caixa Econômica Federal e do BNDES ao longo de vários anos. Além disso, para fechar as contas do ano passado, o governo abateu de suas despesas, como era permitido pela Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), R$ 39,3 bilhões em investimento do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC).
O TCU observou que, com o desconto dos gastos com o PAC, a meta do superávit primário foi reduzida de R$ 97 bilhões para R$ 57,7 bilhões, valor que, por meio de outros artifícios, o governo cumpriu com folga, pois contabilizou um resultado primário de R$ 85 bilhões. O relatório deixa claro que esse resultado não decorreu de uma efetiva redução de gastos, mas da postergação de pagamentos, por meio de restos a pagar, que superaram R$ 80 bilhões, e receitas extraordinárias.
Quanto aos gastos efetivos do governo, boa parte não produziu os resultados esperados pelo País. Como vem ocorrendo desde a chegada do PT ao poder, projetos deficientes, atrasos frequentes que deterioram o que já foi executado, falhas de fiscalização do andamento das obras em execução, entre outros problemas de gestão, impõem gastos adicionais e retardam a conclusão dos investimentos.
Na parte estritamente contábil, o TCU identificou o não registro, pela Secretaria do Tesouro Nacional, do passivo atuarial do regime de previdência do funcionalismo público, e que está estimado em R$ 1,25 trilhão no projeto de LDO para 2014, em exame pelo Congresso. Com a contabilização desse valor, como exige o TCU, “o patrimônio líquido da União passaria de um valor positivo de R$ 761 bilhões para um valor negativo de R$ 490 bilhões”, observou o relatório das contas do governo de 2012,
O Tesouro argumenta que o cálculo do passivo atuarial exige estudos adicionais e que seu reconhecimento nas contas da União deve ter, como contrapartida, o lançamento dos ativos correspondentes à capitalização do fundo que administrará a previdência do servidor público. E preciso que os cálculos do passivo atuarial e do ativo sejam apresentados para que o contribuinte saiba com clareza o tamanho do rombo.