Canetada petista cria quatro tribunais

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O presidente em exercício do Congresso Nacional, deputado André Vargas (PT-PR), confirmou ontem a manobra já anunciada de aproveitar a ausência do titular, Renan Calheiros (PMDB-AL), para promulgar a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) nº 544/2002 que cria quatro tribunais regionais federais (TRFs) no país. A medida já havia sido publicamente rechaçada pelo presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Joaquim Barbosa, e encontra descontentamento no Planalto por provocar aumento de gastos em tempo de austeridade. Ainda que não corresponda aos R$ 8 bilhões calculados por Barbosa, o custo estimado das novas unidades pode chegar a R$ 1,4 bilhão por ano.

Em abril, Renan havia sinalizado que não pretendia promulgar a PEC por considerar ter havido erro na tramitação. André Vargas foi um dos maiores incentivadores da proposta, que beneficia seu estado, e avisou que, como substituto imediato no comando do Congresso, poderia convocar a sessão em que o texto seria promulgado assim que assumisse o posto interinamente. Com a viagem de Calheiros para Portugal, o petista apressou-se em marcar a promulgação para a manhã de ontem. No evento, ainda disse ter o aval do peemedebista para fazê-lo, mas foi desmentido em uma nota minutos depois (leia ao lado).

Vargas enfrentou ainda o Palácio do Planalto, de onde já haviam saído recados recriminando tentativas de aumentar os custos da máquina pública. “Todo e qualquer aumento de gastos preocupa o governo, mas, evidentemente, se o Congresso decidir promulgar (a PEC), o Estado brasileiro tem que suportar essa despesa”, comentou o vice-presidente da República, Michel Temer, quando a proposta foi aprovada, em abril. Levando em conta o Orçamento médio previsto para os cinco tribunais regionais federais já existentes em 2013, cada novo TRF poderá custar R$ 346 milhões às contas do Judiciário por ano. Ao todo, o valor anual chegaria a R$ 1,4 bilhão.

O número é bem menor que o ventilado pelo ministro Joaquim Barbosa no início de abril — de R$ 8 bilhões por ano. Na época, o presidente do STF ainda afirmou, durante uma reunião com entidades que defendiam a PEC, que ela estava sendo aprovada de forma “sorrateira” para atender interesses de magistrados e que os tribunais seriam construídos em “resorts, em alguma grande praia”. Ontem, após a sessão, André Vargas disparou contra o ministro. “Quem faz política são os deputados eleitos pelo povo, compete ao presidente do Supremo administrar e representar aquele poder. Ele tem as suas opiniões, mas o que nos interessa mesmo é a opinião do pleno do STF. Não vamos levar em conta só as declarações do ministro, ele precisa ter um pouco mais de equilíbrio”, declarou.

Superavit
Relator do Plano Plurianual (PPA) para o período de 2012 a 2015, o senador Walter Pinheiro (PT-BA) disse ontem que não haverá verba suficiente para criar os TRFs no mesmo ano. “Para esta primeira reestruturação, há uma previsão de algo em torno de R$ 300 milhões no PPA. Óbvio que isso não é suficiente e o Judiciário sabe que será impossível instalar quatro tribunais de uma vez, mas cabe a ele agora encaixar e planejar o custeio da instalação, pode até chegar à conclusão da necessidade de instalar os TRFs numa ordem cronológica, um por vez para abrigar isso na peça orçamentária”, ressaltou.

Vargas retrucou as críticas sobre o alto custo da PEC. “A Justiça Federal arrecada R$ 15 bilhões e gasta de R$ 7 bilhões a R$ 8 bilhões. Ainda haverá um superavit de R$ 7 bilhões, portanto o orçamento da Justiça Federal existe. Basta ter bom senso”, defendeu. O presidente da Ordem dos Advogados do Brasil, Marcus Vinicius Furtado, também afirmou que os custos não serão tão elevados. “Os governos estaduais já estão cedendo a estrutura física para compor os tribunais. A OAB ficará atenta para que não haja criação abusiva de cargos e custo elevado, mas com estrutura enxuta”, comentou.

A PEC apenas modifica o item da Constituição que limitava o número de tribunais a cinco, passando para nove em todo o país. Após a promulgação, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) precisa redigir um projeto de lei especificando a quantidade de cargos administrativos e de desembargadores para os TRFs. Em reunião ontem com entidades e parlamentares, o presidente do STJ, Felix Fischer, assegurou que os dados serão discutidos no Conselho da Justiça Federal (CJF) até o fim deste mês e que o projeto será enviado ao Congresso até agosto.

“A Justiça Federal arrecada R$ 15 bilhões e gasta de R$ 7 bilhões a R$ 8 bilhões. Ainda haverá um superavit de R$ 7 bilhões, portanto o orçamento da Justiça Federal existe. Basta ter bom senso”
André Vargas (PT-PR), deputado federal

“O Judiciário sabe que será impossível instalar quatro tribunais de uma vez, mas cabe a ele agora encaixar e planejar o custeio da instalação”
Walter Pinheiro (PT-BA), senador e relator do Plano Plurianual