Municípios longe da transparência

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Autor(es): ANA D”ANGELO

Governo comemora o primeiro ano da LAI, mas FGV quer auditoria para averiguar a qualidade e o prazo do serviço

A maioria dos municípios brasileiros não mantém portais com informações sobre sua administração, detalhando orçamento, contratos, licitações, quadro de pessoal e respectiva remuneração, entre outros dados públicos. No primeiro aniversário da Lei de Acesso à Informação (LAI), apenas 5% das cidades aderiram ao Programa Brasil Transparente, oferecido pelo governo federal, para capacitar servidores e permitir o acesso ao Sistema Eletrônico do Serviço de Informação ao Cidadão (e-Sic). No programa, estão apenas 281 municípios de um total de 5,6 mil.

Já no Executivo federal, o controlador-geral da União, Jorge Hage, comemora os resultados, citando que foram respondidas 95,8% das 87.119 solicitações de informações encaminhadas pelos cidadãos. Dessas, 79,2% foram plenamente atendidas e 9,8% negadas. Ele não quis dizer a razão das recusas de atendimento. Outros 7% ficaram sem resposta porque se referiam a assuntos de outro órgão ou o dado não existia, garantiu o ministro Hage. O tempo médio para recebimento da informação foi de 11,3 dias. Os órgãos mais demandados foram a Superintendência de Seguros Privados, com 10% do total; o Instituto Nacional de Seguro Social (INSS); e a Petrobrás.

Importante instrumento para fortalecimento da democracia e da cidadania, a Lei 12.527, que entrou em vigor em 16 de maio de 2012, garante aos brasileiros o acesso aos dados públicos do Executivo, Legislativo e Judiciário, sem que seja necessário justificativa para o pedido. Mesmo com os altos índices de atendimento mencionados pela CGU, na prática, o cidadão não tem a plena abertura às informações e os órgãos ainda exigem a finalidade do pedido encaminhado. Além disso, não há garantia de que a resposta entregue atende ao que foi pleiteado.

Qualidade
Para os especialistas, é necessária uma fiscalização para verificar a qualidade da informação prestada ao cidadão. Uma equipe de professores da Fundação Getúlio Vargas (FGV) promoverá uma auditoria no segundo semestre, para verificar se a lei está sendo cumprida devidamente. Para isso, encaminharão centenas de perguntas a diversos órgãos para aferir o prazo e o teor da resposta, e se atende ao solicitado.

Os estudiosos reconhecem, no entanto, que levará um tempo maior para que o servidor público tenha consciência da transparência do dado público. “É um processo que tem um potencial de mudança grande na gestão pública, envolve os três entes federados e muitos órgãos públicos. É de se esperar que haja grupos mais ou menos resistentes ao processo”, observou o cientista político Rafael Cortez, da Tendências Consultoria.

O professor Gregory Michener, da Escola Brasileira de Administração Pública e de Empresas (Ebape), da FGV, ressalvou o fato de a LAI ser um paradigma novo em um país sem tradição de transparência, que passou décadas sob influência autoritária, mas que a mídia e a opinião pública não podem se descuidar e devem manter vigilância constante sobre o cumprimento da legislação. “São importantes a vigília e o debate na mídia, que está faltando bastante”, alertou. Para ele, a lei deve ser assunto frequente nos veículos de comunicação. Michener defende ainda avaliações independentes acerca da sua aplicação. “Em qualquer país, é usual a auditoria da Lei de Acesso à Informação”, afirmou o professor da FGV.

Uma dessas informações mais básicas, a remuneração dos respectivos servidores de cada ente público não está sendo fornecida de forma a permitir a qualquer cidadão fazer a análise global dos dados para avaliar o perfil da folha de pagamento e saber, por exemplo, quantos estão em cada faixa salarial. É o que acontece com a divulgação feita pelos diversos tribunais do Judiciário, o Ministério Público Federal e o Tribunal de Contas da União. A Lei 12.257 diz claramente que os sistemas de divulgação deverão “possibilitar a gravação de relatórios em diversos formatos eletrônicos, inclusive abertos e não proprietários, tais como planilhas e texto, de modo a facilitar a análise das informações”.