Uma política fiscal fortemente expansionista

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Valor Econômico – 12/11/2012

 

 

O ministro da Fazenda, Guido Mantega, admitiu, na semana passada, aquilo que a maioria dos especialistas em finanças públicas já sabia: o superávit primário nas contas públicas de 3,1% do Produto Interno Bruto (PIB) não será obtido neste ano. Mantega atribuiu o descumprimento da meta fiscal à frustração das receitas, em virtude do desaquecimento da economia, e às desonerações tributárias feitas pelo governo.

Faltou, no entanto, uma terceira explicação. As despesas da União estão crescendo em ritmo acelerado neste ano, muito superior à expansão da economia. De janeiro a setembro, os gastos do Tesouro subiram 5,6%, em termos reais (utilizando-se o IPCA para corrigir os valores), em comparação com igual período do ano passado. A Secretaria do Tesouro Nacional (STN) estima que, no período, os gastos do Tesouro cresceram 4,9% acima do aumento do Produto Interno Bruto (PIB).

O descumprimento da meta resulta, portanto, de uma decisão do governo de adotar uma política fiscal inteiramente diversa da executada em 2011, quando o controle dos gastos fez parte da estratégia de criar espaço para a redução das taxas de juros. O governo chegou a anunciar a elevação do superávit primário em R$ 10 bilhões, em agosto do ano passado, para permitir ao Banco Central reduzir os juros. Assim, as despesas cresceram em ritmo menor do que o PIB. Em 2010, os gastos do Tesouro representaram 11,7% do PIB. Em 2011, eles caíram para 10,6%, de acordo com a STN.

Este ano, o governo não se preocupou em controlar os seus gastos. Embora não tenha explicitado, a área econômica abandonou o mix da política econômica adotado em 2011 – com a política fiscal ajudando a política monetária no controle da demanda agregada da economia. O governo passou a gastar muito e não apenas com investimentos. De janeiro a setembro, as despesas de custeio cresceram 8,1% acima da expansão nominal do PIB, em comparação com igual período do ano passado, também segundo a STN.

O ritmo dos investimentos também está forte, pois ele cresceu 23,3% nos primeiros nove meses deste ano, em comparação com igual período de 2011. Deve-se, no entanto, fazer uma ressalva. Os gastos do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) atingiram R$ 24,3 bilhões de janeiro a setembro. Mas se desse total forem retiradas as despesas do programa Minha Casa Minha Vida (MCMV) – que para a maioria dos analistas são subsídios, ou seja, gastos de custeio -, os investimentos do PAC no período caem para R$ 13,4 bilhões, o mesmo valor do ano passado, também sem o MCMV.

A política fiscal executada neste ano pelo governo federal é, portanto, fortemente expansionista. Para avaliá-la melhor, não se deve considerar apenas os gastos primários da União. É preciso incluir também as maciças transferências de recursos do Tesouro aos bancos públicos, pois elas representam impulso considerável sobre a demanda agregada da economia, embora não tenham impacto imediato sobre o resultado primário do setor público.

Não são apenas os empréstimos do Tesouro ao BNDES, que continuaram neste ano. O governo forneceu R$ 21,1 bilhões para o Banco do Brasil e a Caixa Econômica Federal – recursos que se destinam ao financiamento da safra, de material de construção e de bens de consumo duráveis.

Junte-se a isso a determinação do governo de conceder R$ 20 bilhões em crédito subsidiado aos governos estaduais para que realizem investimentos, dentro do programa Proinveste. Os empréstimos para os Estados resultarão em novos gastos primários e, desta forma, impulsionarão a demanda da economia e reduzirão o superávit primário dessas unidades da federação. É importante observar que boa parte dessas operações terá impacto fiscal apenas no próximo ano. Outras medidas fiscais adotadas pelo governo este ano também terão repercussões em 2013. Neste caso está a desoneração da folha de salários, com custo estimado para o Tesouro de R$ 15 bilhões.

A dificuldade este ano é maior do que parece. Não há garantia de que o governo conseguirá cumprir inclusive a meta ajustada pelos abatimentos do PAC. Para 2013, o cenário que se desenha também não é de obtenção de um superávit primário de 3,1% do PIB, ao contrário do que tem colocado o Banco Central em suas projeções.