Contas externas, fator de risco

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Um buraco de US$ 80 bilhões em conta corrente e um superávit comercial de apenas US$ 5 bilhões ainda estão nas previsões do Banco Central (BC) para este ano, apesar da ligeira melhora das contas externas. É cedo para lançar rojões. O déficit em transações correntes ficou em US$ 78,39 bilhões nos 12 meses terminados em julho. Pela primeira vez desde agosto do ano passado o resultado negativo ficou abaixo de US$ 80 bilhões. Também pela primeira vez nesse período esse déficit foi inferior a 3,5% do Produto Interno Bruto (PIB). Mas pouco inferior: ficou em 3,45%. O resultado previsto para o ano é equivalente a 3,48%. O investimento direto projetado, de US$ 63 bilhões, ficará bem abaixo do necessário para cobrir o déficit. Isso já ocorreu em 2013.
Quando é insuficiente o investimento direto estrangeiro, é preciso recorrer a outros recursos para fechar as contas – empréstimos comerciais ou aplicações em papéis. Soluções como essas envolvem endividamento e operações com capitais mais instáveis que o dinheiro destinado diretamente ao setor empresarial. Os custos são obviamente maiores, assim como o risco de uma reversão abrupta no fluxo de recursos.
Movimentos desse tipo afetaram vários mercados emergentes desde o ano passado, incluído o Brasil, depois do anúncio de uma redução gradual dos estímulos monetários nos Estados Unidos. A política planejada e executada pelo Federal Reserve (Fed), o mais poderoso dos bancos centrais, inevitavelmente influencia os mercados de todo o mundo. O resultado, nesse caso, foi a valorização do dólar. Para evitar ou atenuar o efeito inflacionário do encarecimento da moeda americana, o Banco Central do Brasil iniciou uma política de intervenção regular no mercado.
Países com fundamentos econômicos frágeis, como inflação elevada e contas públicas em mau estado, são especialmente vulneráveis a mudanças de humor nos mercados financeiros internacionais. Contas externas no vermelho e baixas taxas de crescimento econômico podem tornar o quadro mais complicado. Todos esses problemas são visíveis no Brasil.
Capitais estrangeiros continuam chegando em volume mais que suficiente para cobrir a insuficiência da conta corrente, mas com composição menos favorável. O País tornou-se mais dependente de recursos especulativos. Com a perspectiva de aumento dos juros americanos em 2015, possivelmente dentro dos próximos 12 meses, as condições internacionais de financiamento tendem a ficar mais apertadas. O cenário será especialmente ruim para países com as contas externas em mau estado. Na melhor hipótese, recursos mais caros serão um importante peso a mais sobre uma economia já enfraquecida e pouco dinâmica.
Ministros da área econômica mostram despreocupação. Quando se fala sobre a piora do quadro financeiro global, mencionam os mais de US$ 370 bilhões de reservas. Sem dúvida, esse é um fator de segurança, mas é tolice confiar demais nesse colchão. Reservas são úteis quando se enfrentam choques inesperados ou dificilmente evitáveis. Mas podem esgotar-se com assustadora rapidez quando a desconfiança dos investidores se alastra e alimenta as apostas contra o país.
Além do mais, ninguém deve guiar perigosamente só porque dispõe de um bom airbag. Mas o governo brasileiro tem agido dessa maneira, como se um grande volume de reservas cambais tornasse desnecessários quaisquer cuidados na política econômica. Neste ano, até a terceira semana de agosto, o valor das exportações foi 0,3% menor que o de um ano antes, pela média dos dias úteis. A corrente de comércio, a soma de exportações e importações, foi 1,7% menor à de igual período de 2013. Não há como atribuir esses números à crise externa. Outros países têm melhorado seu desempenho comercial mesmo num cenário global desfavorável.
No caso do Brasil, o comércio de mercadorias é especialmente importante para o resultado das transações correntes, porque há um déficit estrutural nos outros componentes, as contas de serviços e de rendas. Mas o governo parece gostar de viver perigosamente.