Denúncia de desvio de verba derruba número 2 do Trabalho

179

Um dia após o estouro do escândalo no Ministério do Trabalho, o secretário executivo da pasta, Paulo Roberto Pinto, deixou ontem o cargo. Para evitar ser demitido, ele entregou de manhã uma carta ao ministro do Trabalho, Manoel Dias, comunicando seu afastamento e informou que se defenderá das acusações de desvios de recursos em convênio celebrado com o Instituto Mundial do Desenvolvimento e da Cidadania (IMDC).

“De modo a preservar a minha família e a imagem deste ministério, decido solicitar à Vossa Excelência a exoneração do cargo, para que eu possa contribuir com a elucidação dos fatos e provar a minha inocência perante as instâncias competentes” afirmou Pinto. O secretário disse ainda ter a convicção de que sempre agiu de acordo com os princípios éticos e balizado-res da moralidade pública. “Nas minhas duas passagens por este ministério, sempre procurei atuar em parceria estreita com os órgãos de controle no sentido de prevenir e coibir eventuais abusos na aplicação de recursos geridos pelo Ministério do Trabalho” disse Pinto.

Na carta, Pinto demonstra surpresa com as denúncias envolvendo Antônio Fernando Dec-nop Martins, subsecretário de Planejamento, Orçamento e Administração preso pela PF, que lhe foi indicado pelo secretário federal de Controle Interno da CGU, “por tratar-se de servidor público efetivo dotado das melhores referências profissionais, havendo, inclusive, exercido cargo equiparado na própria Controladoria Geral da União”

Ao falar pela primeira sobre a crise na suapas-ta, Manoel Dias anunciou ontem que criará um mutirão para fazer um pente-fino nos contratos e convênio com entidades. Afirmou ainda que estão suspensos o repasse de verbas de convênio com o IMDC.

— Vou pedir ao Ministério do Planejamento para contratarmos servidores para esse mutirão. Temos um déficit de servidores. O ministério não tem estrutura para detectar todas as falhas — reconheceu o ministro.

IMDC AMBA TEM CONTRATOS DE R$ 36,2 MILHÕES

Dias explicou que recursos do ministério, num total de R$ 36,2 milhões, ainda estão previstos em contratos que sua pasta fez com dois governos (Ceará e Espírito Santo) e com um município, Serra (ES), que na ponta beneficiam o
IMDC. O pagamento não foi integralmente efetivado e, por isso, o governo vai recomendar a esses entes que suspendam o contrato e deixem de repassar recursos à entidade que é investigada em operação da Polícia Federal.

Os três contratos ainda vigentes e que envolvem recursos do Ministério do Trabalho para o IMDC foram assinados com a empresa pela Secretaria de Trabalho do Ceará (R$ 15,8 milhões), com a Secretaria de Ciência e Tecnologia do Espírito Santo (também R$ 15,8 milhões) e com a Prefeitura de Serra (R$ 4,6 milhões). São programas para treinamento e qualificação de trabalhadores.

O ministério informou que o repasse feito ao IMDC, nesses casos, não foi alto porque a execução dos projetos ainda está no início, e os repasses, são parcelados.

— Da nossa parte, não vamos repassar mais nada — disse o ministro.

Dias não soube informar quantos contratos e convênios foram celebrados pelo ministério:

— Estou aqui há apenas cinco meses. Não sou um gênio ainda. E nem sonho em ser.

Dias disse ainda que não demitiu Pinto anteontem, no calor das denúncias, porque precisava pensar mais um pouco.

— Foi decisão pessoal minha (não promover a demissão anteontem). Precisava amadurecer mais. É o segundo cargo mais importante. É preciso um mínimo de respeito.

Dias negou que o funcionário Anderson Brito Ferreira, preso pela Polícia Federal e que chegou a ser considerado foragido, não era seu assessor no gabinete, ao contrário do que foi divulgado na imprensa . Segundo Dias, ele era responsável pelo Departamento de Igualdade Racial do ministério.

— Ele trabalha no quarto andar (o gabinete do ministro fica no quinto). Nunca trabalhou comigo!

Anderson Pereira se entregou segunda-feira à noite na sede da Polícia Federal, em Brasília. Segundo a polícia, o ex-assessor seria encaminhado ontem para o presídio da Papuda. Anderson teve a prisão decretada pela Justiça Federal de Belo Horizonte.

Anderson já prestou depoimento sobre as fraudes investigadas na Operação Esopo da Polícia Federal. A polícia suspeita que o ex-assessor recebeu propina para facilitar o repasse de dinheiro para o Instituto Mundial de Desenvolvimento e Cidadania. A ONG, com sede em Belo Horizonte, recebeu R$ 400 milhões do ministério para promover cursos de qualificação de trabalhadores. Boa parte da verba teria sido desviada em projetos su-perfaturados ou executados pela metade.

O ministro do Trabalho afirmou também que pediu à Polícia Federal acesso ao inquérito que deu origem à operação que, anteontem, predeu 22 pessoas, incluindo servidores de sua pasta:

— Não sabemos nem quantos nem quem foram presos.

Logo no primeiro dia da operação, o ministro anunciou a exoneração dos três servidores que tiveram a prisão decretada pela Justiça: Ander-son Pereira, Antônio Fernando Decnop e Geraldo Riesenbeck, coordenador-geral de Convênios do ministério.

Dias disse ainda que a crise não atinge seu partido, o PDT. Ele alegou que irregularidades existem em todos os lugares:

— Não há comprovação de que os trabalhistas praticaram atos indecorosos ou de corrupção. Insinuações existem, sempre. O PDT tem como marca a qualidade, a boa gestão. A contribuição do trabalhismo para esta área vem desde Getúlio Vargas passando por João Goulart. O partido tem tradição nesta área.

Infelizmente, aconteceu isso.

Ao falar do PDT, disse se tratar de um partido “ficha-limpa” — Em qualquer lugar tem irregularidade. Não é só no Ministério do Trabalho. O que ocorreu não é bom, mas é fato. E temos que enfrentar. O PDT é um partido ficha-limpa.

O subsecretário de Planejamento do ministério, Nilton Machado, ocupará interinamente a Secretaria Executiva, no lugar de Pinto.

A ministra da Secretaria de Relações Institucionais, Ideli Salvatti, disse ontem que, aparentemente, a situação do secretário executivo do Ministério do Trabalho era insustentável. Depois de solenidade no Palácio do Planalto, a ministra informou que, diante de denúncias, a presidente Dilma Rousseff tem sempre a mesma postura: pedir explicações e, se elas não forem satisfatórias, demitir o envolvido.

— A palavra da presidenta em todos esses casos é a mesma: que apresente as justificativas, que se defenda e, ficando insustentável, que saia do governo. E parece que é o que aconteceu. A informação que eu tive é que o secretário-executivo pediu demissão — afirmou Ideli.