Voto aberto corre risco de virar pizza

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No Senado, líderes partidários decidem fatiar proposta da Câmara que acaba com o sigilo em todas as votações. Eles vão aprovar apenas a parte que torna públicos os processos de perda de mandato.

 

Celebrada como um avanço democrático na noite de terça-feira por deputados de todas as legendas — a aprovação da emenda constitucional foi unânime em plenário —, a derrubada do voto secreto nas votações do Congresso ficará restrita apenas aos processos de cassação e não a todos os escrutínios que ocorrerem no parlamento. Todas as legendas, tanto as que integram a base aliada quanto as que fazem oposição ao Palácio do Planalto, têm dificuldades em aprovar a medida mais ampla. Por isso, os eleitores continuarão sem saber como votam os parlamentares escolhidos por eles a cada quatro anos.

Com isso, com o apoio de todos os líderes partidários reunidos ontem com o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), ficou decidido que a proposta de emenda à Constituição (PEC) aprovada pela Câmara será fatiada e promulgada apenas o que for consenso em todas as proposições que tratam do assunto: o voto aberto nos casos de perda de mandato. “A outra parte da proposta será enterrada no limbo legislativo”, adiantou um aliado de Renan.
Os interesses que levaram a essa solução permeiam todas as legendas e variam de partido a partido. O PMDB, dividido entre Câmara e Senado, sucumbiu em uma guerra de vaidades protagonizada pelos presidentes das duas Casas — Henrique Eduardo Alves (RN) e Renan Calheiros (AL), somado ao líder do partido na Câmara, Eduardo Cunha (RJ) — e transformou a tramitação das propostas em uma batalha por uma agenda positiva (leia mais na página 4).

À oposição, que sempre reclama do rolo compressor comandado pela base aliada do governo, também é conveniente uma saída mais modesta. Agora que o Congresso resolveu, mensalmente, analisar os vetos presidenciais, parlamentares do PSDB, DEM e PPS acham que, com o voto aberto, ficaria mais fácil para o Planalto controlar os governistas. “Em votações técnicas, como os vetos e matérias orçamentárias, o Executivo tem muito mais força para pressionar seus parlamentares a manter o veto presidencial”, disse o relator da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), deputado Danilo Forte (PMDB-CE).

Autor da PEC que acaba com o voto secreto apenas para os processos de cassação, o senador Álvaro Dias (PSDB-PR) considerou a aprovação da proposta da Câmara uma manobra política. Ele teme que, no fim das contas, nenhuma das duas avance. “A aprovação da PEC 349 (votada na Câmara) terá o efeito prático de adiar a aprovação do voto aberto para a cassação de mandato”, lamentou ele.
Dias explicitou qual seria o receio de alguns senadores para a quebra ampla, geral e irrestrita do sigilo nas votações. “Na aprovação de nomes indicados para o Supremo Tribunal Federal e para Procuradoria Geral da República, por exemplo, há senadores que defendem que a votação deve permanecer secreta”. Segundo apurou o Correio, nos casos específicos dessas votações, os parlamentares temem que, um voto contra a indicação crie uma inimizade que poderá, no futuro, facilitar a abertura de um processo criminal ou administrativo.

“Resposta concreta”

No fim da manhã de ontem, o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), indicou qual seria o caminho a ser adotado. “A resposta mais concreta que nós podemos dar é votar, aqui no Senado, o que a Câmara já votou e é consenso, que é a abertura do voto no julgamento de deputado e senador. É essa a resposta concreta que a sociedade cobra, e nós podemos dá-la. O restante tramita mais demoradamente”, afirmou.

Ele lembrou que abrir o voto de maneira geral é delicado porque permite um monitoramento político pelo governo. “Qualquer governo, esse ou outro”, corrigiu-se. O senador não acha que a sociedade acabará por concluir que tudo não passa de um jogo de cena. “O voto aberto para cassação de mandato já tramita na Câmara há mais de um ano (na verdade, o primeiro turno da PEC foi aprovado em 2006). Era essa proposta que devia ser apreciada”, justificou.
Para o deputado Chico Alencar (PSol-RJ), Renan está criando um pulo do gato para fazer prevalecer seu desejo. “Ele está querendo fazer uma leitura do resultado de ontem a partir do que ele acredita ser o desejo secreto de alguns deputados. E aí faz uma leitura engenhosa do regimento”, criticou.

Indicação
As nomeações para o cargo de procurador-geral da República e ministros do Supremo Tribunal Federal são de competência exclusiva da presidência da República. No caso da PGR, as últimas indicações basearam-se no nome mais votado na lista tríplice elaborada pela categoria. Mas os nomes indicados pelo Planalto precisam ser sabatinados e aprovados pelo Senado, tanto na Comissão de Constituição e Justiça quanto no plenário.