Controle mais frouxo

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Autor(es): Fernanda Krakovics

Na tentativa de destravar a máquina pública no momento em que enfrenta uma crise na base aliada e baixa popularidade, o governo federal flexibilizou as regras para realização e pagamento de convênios firmados desde 2008. Pela nova legislação, estados e municípios só precisam comprovar regularidade fiscal para o recebimentos de recursos do Orçamento da União no ato de assinatura do contrato. Assim, se um município ficar inadimplente no decorrer de uma obra, o governo federal não suspenderá o repasse de recursos já previstos no convênio. O principal interesse do Palácio do Planalto é concluir as obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), uma das promessas de campanha da presidente Dilma Rousseff.

Nova regra divide técnicos

A medida já havia sido incluída na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) que está em vigor este ano e foi estendida, no último dia 2 de agosto, a convênios celebrados a partir de 30 de maio de 2008. Isso foi feito por meio de portaria conjunta dos ministérios do Planejamento, Fazenda e da Controladoria Geral da União (CGU), publicada no Diário Oficial. Segundo a Comissão Mista de Orçamento (CMO), R$ 6,2 bilhões foram inscritos em restos a pagar em 2013, relativos a convênios de anos anteriores. Ou seja, esse seria o estoque de recursos referentes a convênios antigos que estão pendentes de pagamento, e que podem ganhar celeridade a partir de agora.

A nova regra divide técnicos do Orçamento. Uma corrente entende que a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) exige, antes de cada repasse de recursos de um mesmo convênio, a comprovação de que o ente a ser beneficiado não está inadimplente. Outra ala, no entanto, afirma que suspender a transferência de dinheiro já previsto no convênio aumenta os prejuízos aos cofres públicos, porque as obras ficam inacabadas e, ao serem retomadas, têm custo maior.

O Ministério do Planejamento afirmou que a medida não fere a Lei de Responsabilidade Fiscal. Segundo o ministério, a LRF prevê a verificação da regularidade fiscal dos estados e municípios no momento da celebração dos convênios, e não para o repasse de cada parcela. “Isto porque a confirmação do convênio se dá no momento da sua assinatura, e não no repasse de cada parcela. A norma visa dar celeridade à execução dos programas realizados por meio de convênios e contratos de repasse”, afirmou o Planejamento, por meio de nota.

A Portaria Interministerial 274, de 1º de agosto de 2013, estabelece que a Instrução Normativa 1, de 15 de janeiro de 1997, da Secretaria do Tesouro Nacional, não se aplica aos convênios celebrados a partir de 30 de maio de 2008. Na prática, essa medida dispensaria verificação de regularidade fiscal do ente conveniado para liberação financeira dos recursos dos convênios em andamento, e desobrigaria consulta ao Cadastro Único de Convênios (Cauc). Uma das situações que mais afetam a regularidade fiscal das prefeituras, e por isso elas são inscritas no Cauc, são dívidas com o Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS), por exemplo.

A Controladoria Geral da União argumenta que o momento da verificação da regularidade fiscal dos municípios foi tratada na LDO de 2013, e não na portaria 274, e não respondeu se a medida contraria ou não a Lei de Responsabilidade Fiscal. Ainda de acordo com a CGU, a Instrução Normativa 1, de 1997, já não podia ser aplicada a partir de maio de 2008, por causa da edição de outra norma interna do governo. E que teria sido citada agora apenas para corrigir um erro de redação.

Já a LDO de 2013, aprovada no ano passado, estabeleceu claramente que a demonstração, por parte de estados e municípios, do cumprimento das exigências para a realização de transferência voluntária se dará exclusivamente no momento da assinatura do respectivo convênio ou contrato, ou na assinatura dos aditivos de valor. Antes, isso era cobrado antes do repasse de cada parcela, o que acabava travando o processo.

Estudo da Confederação Nacional dos Municípios (CNM) mostra o quanto as prefeituras dependem desses convênios, que são muitas vezes provocados por emendas de parlamentares ao Orçamento da União: o levantamento indica que, no governo Lula, foram celebrados 95.579 convênios com prefeituras. No governo Fernando Henrique, foram 114.569. Outro dado da CNM é que, nos últimos dez anos, apenas 16,9% das emendas parlamentares foram pagas pelo governo.

Restos a pagar derivam de convênios

O presidente da CNM, Paulo Ziulkoski, disse que os restos a pagar de anos anteriores são todos relativos a convênios ainda pendentes e que as mudanças na legislação são para tentar resolver problemas.

– Mostramos que, nos últimos dez anos, foram 62 mil empenhos pendentes, com R$ 25,5 bilhões em dívidas com os municípios. Estes restos a pagar são todos de convênios, sendo que 80% são de obras e 20% de compra de equipamentos. Se existe a obra, se tiver que flexibilizar, tem que fazer e dar um fim a esse problema – disse Ziulkoski, lembrando que a União flexibilizou a Lei de Licitações, criando o Regime Diferenciado de Contratações (RDC).