As greves do setor público

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O Estado de S. Paulo – 08/02/2013

 

 

Com receio das greves que algumas categorias de servidores poderão deflagrar no próximo ano, quando o País sediará a Copa do Mundo e a presidente Dilma Rousseff disputará a reeleição, o governo converteu em prioridade a aprovação, pelo Congresso, da regulamentação do direito de greve do funcionalismo público. Esse direito foi reconhecido pela Constituição de 1988, que é clara e taxativa ao condicionar seu exercício aos “termos e limites de lei específica”.

A Constituição está em vigor há quase 25 anos, mas essa lei não foi editada por causa da resistência do funcionalismo público. Os Três Poderes têm mais de 1 milhão de servidores. O presidente Fernando Henrique Cardoso tentou, sem sucesso, aprovar essa regulamentação. O governo do presidente Lula preparou um projeto de regulamentação que, entre outras medidas, exigia que a deflagração de uma greve no setor público fosse decidida em as-sembleias em que estivessem presentes mais de dois terços das categorias mobilizadas. Apesar de Lula dispor de maioria no Congresso, o projeto foi engavetado por pressão de centrais sindicais aliadas ao PT.

Há dois anos, em meio a uma onda de greves de servidores federais, o senador Aloysio Nunes (PSDB-SP) apresentou um projeto com o mesmo objetivo. A proposta prevê o uso de métodos alternativos de solução
de conflitos, como mediação, conciliação e arbitragem. Coíbe o abuso do direito de greve dos servidores municipais, estaduais e federais. E exige, durante as greves, a manutenção dos serviços públicos essenciais. No caso dos servidores que trabalham na área da segurança pública, o projeto prevê a manutenção mínima de 80% dos serviços. No caso dos serviços públicos não essenciais, os grevistas devem manter 50% dos serviços em atividade. Em 2012, porém, senadores do PT, pressionados pela Central Unica dos Trabalhadores, conseguiram que o projeto fosse submetido à Comissão de Direitos Humanos, cujo presidente – Paulo Paim (PT-RS) – o engavetou, alegando que a regulamentação de greves de servidores é incompatível com a democracia.

No final de 2012, depois que algumas categorias de servidores bem remunerados tentaram parar toda a administração federal, para pressionar o Executivo por maiores reajustes salariais, a presidente Dilma Rousseff mobilizou as lideranças do governo para tentar aprovar em 2013 a regulamentação do direito de greve do funcionalismo. Assim que a iniciativa foi divulgada, os líderes de várias categorias convocaram o Fórum Nacional Permanente de Carreiras Típicas do Estado. A entidade, que reúne associações de servidores das áreas de fiscalização agropecuária e tributária, controladoria, segurança pública, diplomacia, advocacia e defensoria pública, comér-
cio exterior, planejamento e Previdência Social, está montando uma estratégia para deter Dilma.

“Preocupa que, sob o argumento de regulamentar o exercício da greve, o governo esteja negando um direito constitucional”, diz o vice-presidente do Fórum, Marcos Leôncio Ribeiro. Ele também acusa o Executivo de “judicializàr a questão”, ao ameaçar acionar judicialmente os servidores que paralisarem serviços essenciais. E afirma que a participação do funcionalismo em greves não pode prejudicar a avaliação de sua produtividade. Há algumas semanas, centrais sindicais e a Confederação dos Trabalhadores no Serviço Público anunciaram que sugerirão ao governo que, em vez de regulamentar o exercício da greve dos servidores, adote a Convenção 151 da Organização Internacional do Trabalho, que propõe a negociação coletiva no serviço público.

Ao defender o “direito constitucional le fazer greves” de todas as categorias, inclusive as Forças Armadas, essas entidades estão exorbitando. No Estado de Direito, o direito de greve não é absoluto. Ao se opor a toda e qu Iquer regulamentação do exercício desse direito, o que essas entidades querem é a continuidade de uma situação em que eías podem cometer abusos e impor constrangimentos à sociedade, convertendo-a em refém de interesses corporativos. Essa, sim, é uma pretensão é incompatível com a democracia.