Regulamentação do direito de greve do funcionalismo

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Fonte: O Globo.

O direito de greve é uma conquista inatacável dos trabalhadores nos países democráticos. Esse princípio se estende também aos servidores públicos, como estabelecido em 1988 pela Constituição que repôs o Brasil na trilha da normalidade institucional. Mas, inscrito o dispositivo na Carta, os legisladores não o regulamentaram. Um vácuo jurídico que só foi corrigido, parcialmente, em 1989, quando as greves no setor privado passaram a ser regidas pela Lei 7.783.

Deixados de fora dessa legislação específica, os servidores se beneficiaram da conveniente leniência de governos e partidos, entre eles o PT, de que sindicatos do setor são aliados de primeira hora. Em 2007, em razão dos seguidos abusos decorrentes de paralisações em repartições públicas, inclusive aquelas que prestam serviços essenciais à população, o Supremo Tribunal Federal estendeu ao funcionalismo os efeitos das normas de greve do setor privado. Foi uma providencial, mas limitada trava nos movimentos de interrupção do trabalho estimulados por corporações sindicais que, principalmente a partir de 2003, agem como condôminos do poder.

A intervenção do STF apenas impôs alguns limites dentro do hiato jurídico decorrente da falta de regulamentação do direito de greve no funcionalismo. Não resolve totalmente a questão. Especificidades inconciliáveis diferem o trabalho em empresas privadas daquele prestado por órgãos do poder público. As consequências de greves no setor público recaem invariavelmente sobre os ombros da sociedade (cujos impostos pagam os salários dos funcionários), e, o que só agrava a questão, com sacrifícios maiores entre a população de mais baixa renda. Quando um médico deixa de atender um paciente num hospital das redes oficiais, ou quando um professor deixa de dar aulas em colégios federais, estaduais ou municipais, ou ainda quando um policial abandona o compromisso com a segurança pública os direitos de todos os cidadãos são violentados.

Há ainda outras diferenças entre fazer greve no setor privado e paralisar serviços públicos. Nas empresas, o empregado que deixa de trabalhar em defesa de seus direitos arrisca-se a sofrer as consequências de seus atos — como demissão ou corte de ponto. Faz parte do jogo de forças entre patrões e trabalhadores. Já os servidores públicos, com o emprego assegurado pela estabilidade, podem parar sem o fantasma da perda de emprego e, por renitente leniência dos governos, sem que de seus vencimentos sejam descontados os dias parados. E, talvez o aspecto mais grave, sem que sejam responsabilizados por interromperem serviços essenciais.

As abusivas greves que recentemente atingiram repartições em todo o país levaram o Planalto a, enfim, considerar a necessidade de tratar em legislação específica, pela regulamentação, a greve no funcionalismo público. Já passa da hora de fazê-lo.