“Emendas PIX” enfraquecem planejamento e transparência dos gastos públicos
O art. 166-A da Constituição Federal, incluído pela Emenda n° 105, de 2019, deu aos parlamentares a possibilidade de alocar recursos de emendas impositivas individuais para Estados, Distrito Federal e Municípios por meio de transferências especiais. Essa modalidade de transferência ficou conhecida como “emenda PIX”, porque independe da celebração de convênio ou instrumento congênere, e os valores passam a pertencer ao ente federado no ato da transferência financeira.
Em 2023, os valores transferidos por meio das “emendas PIX” chegam a cerca de R$ 6,4 bilhões, e respondem por mais de 35% do total das emendas individuais impositivas. Quando considerados apenas os valores destinados a investimentos, os R$ 5,8 bilhões dessa modalidade de transferência representam mais de 70% do total dos investimentos alocados por emendas individuais impositivas.
Parlamentares que têm intermediado recursos para seus estados e municípios usando as transferências especiais disseram que a agilidade nos repasses justifica a opção. De acordo com eles, as transferências com finalidade definida demoram a chegar às suas bases, causando atrasos na realização dos projetos para os quais são destinadas.
A fiscalização das transferências especiais é dividida entre os tribunais de contas dos entes beneficiários e o Tribunal de Contas da União (TCU), conforme Acórdãos recentes do Plenário do TCU (ns° 1758/2023 e 518/2023). Cabe ao TCU a verificação do cumprimento das condicionantes e aos demais Tribunais de Contas a avaliação da regularidade das despesas na aplicação dos recursos.
São duas as condicionantes para a transferência dos recursos por meio das transferências especiais: 1. Indicação de programação finalística do Poder Executivo do ente beneficiado que receberá os recursos; e 2. Direcionamento de 70% dos recursos em despesas de capital, no mínimo. Para atender a essas condicionantes, os parlamentares devem reservar o valor mínimo de investimentos nas emendas, já os entes beneficiários devem informar a área da política pública e a sua programação orçamentária que irá apropriar os recursos transferidos, conforme instruções definidas na Portaria Interministerial MPO/MGI/SRI-PR n° 1, de 3 de março de 2023.
As “emendas PIX” facilitam e aceleram a distribuição de recursos para estados e municípios, como atestam os parlamentares, contudo, de forma desigual e sem qualquer planejamento para implementação de políticas públicas. Levantamento recente realizado pelo Transparência Brasil aponta a incrível variação dos recursos per capita (por habitante) recebidos via transferências especiais em 2023, de R$ 0,06 em Teresina/PI, até R$ 4,6 mil, em São Luiz/RR.
A menor transparência no direcionamento dos recursos também favorece a sua má utilização e desperdícios, como noticiado pela imprensa em reportagem sobre a cidade de Carapicuíba, na região metropolitana de São Paulo. A cidade foi a que mais recebeu “emendas PIX” nos últimos 3 anos, com apoio de diversos parlamentares de diferentes campos políticos, e adotou práticas questionáveis para sua utilização, como o cancelamento de licitações e lançamento de novas contratações a custos mais altos.
A Assecor já tratou do assunto no nosso Podcast Orçamento sem Segredo e na Revista Brasileira de Planejamento e Orçamento. Consideramos que é preciso estimular o Governo Federal a mudar este panorama.
O Brasil precisa de mais transparência no uso dos recursos orçamentários, pois só assim se pode garantir a qualidade do gasto público. Sem isso, podemos desperdiçar oportunidades de realizar boas políticas públicas em todas as áreas.