TCU está dividido sobre “pedaladas”

247

A dois dias da votação, o plenário do Tribunal de Contas da União (TCU) está dividido em relação às contas de 2014 da presidente Dilma Rousseff, segundo três fontes ouvidas pelo jornal O Globo. A discordância é baseada em uma descoberta do Contas Abertas: as chamadas “pedaladas” fiscais”, que aconteceram no ano passado.

A controvérsia em relação à manobra pode levar o julgamento a um empate, com quatro votos a favor da aprovação e quatro pela reprovação. Nesse caso, a decisão é do presidente do TCU, Aroldo Cedraz, que só vota para desempatar. O julgamento será quarta-feira.

Estariam dispostos a votar pela aprovação das contas de Dilma os ministros Walton Alencar, Benjamin Zymler e José Múcio Monteiro. Os ministros Augusto Nardes, relator do processo no TCU, Bruno Dantas e Raimundo Carreiro estariam inclinados a opinar pela reprovação, enquanto Ana Arraes e Vital do Rego ainda não deram uma sinalização mais clara sobre seus votos. O presidente do TCU votará se houver um empate, e não sinalizou ainda qual é seu entendimento.

Um parecer pela rejeição das contas de um presidente seria inédito. A análise do TCU sobre contas presidenciais não é definitiva. De acordo com a Constituição, a atribuição final do julgamento é do Congresso.

Nos últimos dias, a linha de frente do governo Dilma — com o vice-presidente Michel Temer e os ministros da Fazenda, Joaquim Levy, e da Advocacia Geral da União (AGU), Luís Inácio Adams — procurou o relator tentando convencê-lo a votar pela aprovação. Temer falou com Nardes por telefone e os dois ministros foram ao gabinete dele na semana passada para tentar reverter a tendência de voto pela rejeição. O governo intensificará a pressão na véspera da votação.

Em conversas reservadas, ministros do TCU têm dito que o teor do voto do relator será decisivo para baterem o martelo. Em relatório preliminar distribuído aos ministros no fim da semana passada, Nardes detalha a ocorrência das “pedaladas”, interpretadas como irregulares e uma infração à Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF). A manobra fiscal é sinalizada como “alerta” no relatório.

As “pedaladas” foram um represamento de repasses do Tesouro Nacional aos bancos oficiais, que precisaram arcar com pagamentos de benefícios como seguro-desemprego e Bolsa Família. Em abril, os ministros do TCU decidiram que a manobra infringiu a LRF, por se configurar como empréstimo. O governo nega e diz que as “pedaladas” não podem ser usadas no julgamento das contas, por ainda não haver posicionamento definitivo do tribunal sobre o assunto.

Pedaladas foram descobertas pelo Contas Abertas

As pedaladas foram divulgadas pelo Contas Abertas no início do ano passado. No dia 17 de janeiro do ano passado, a entidade encaminhou denúncia ao Ministério Público junto ao Tribunal de Contas da União, com o intuito de que a Corte de Contas pudesse quantificar o real superávit primário de 2013 e tomar as medidas cabíveis em relação às manobras orçamentárias que o governo federal realizou no final do ano passado.

Conforme dados do Contas Abertas levantados na época, a contabilidade postergada ganhou grandes proporções de 2013 para 2014. Pela primeira vez, desde o início da série histórica do Banco Central, em 1997, as despesas de janeiro superaram as de dezembro, por exemplo.

De 2013 para 2014 houve crescimento de 27,8% dos restos a pagar processados (quando só falta o pagamento do serviço prestado) e emissão de bilhões de reais em ordens bancárias nos últimos dias do ano — para que fossem sacadas apenas nos primeiros dias de 2014 — e também pela retenção de receitas estaduais e municipais.

Em dezembro, do dia 1º ao dia 27, a União pagou R$ 2 bilhões em investimentos (obras e equipamentos). No entanto, entre os dias 28 e 31 foram desembolsados R$ 4,1 bilhões. Em resumo, nos quatro últimos dias de 2013, incluindo sábado, domingo e véspera de feriado, o governo emitiu ordens bancárias no dobro do valor que lançara nos 27 dias anteriores.