Combate à corrupção avança, mas resultado ainda é insatisfatório

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As denúncias sobre a possível compra superfaturada de uma refinaria e o suposto pagamento de propina a funcionários da Petrobras colocam a principal estatal brasileira no centro de investigações de corrupção. Os principais órgãos de controle interno e externo da administração pública, como o Tribunal de Contas da União (TCU), a Polícia Federal, a Controladoria Geral da União (CGU) e o Congresso Nacional voltam suas atenções a mais essa denúncia.

Apesar dos esforços das instituições e do aprimoramento da legislação, o Brasil ainda ocupa a 72ª posição na lista dos países considerados mais limpos ou livres de corrupção. O ranking, elaborado pela ONG Transparência Internacional, com sede na Alemanha, mede a percepção da corrupção em 177 países. O Brasil está bem atrás de vizinhos como Uruguai, na 19ª posição, ou o Chile, na 22ª.

Para o ex-ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Ayres Britto, as origens da corrupção no Brasil são históricas e remontam à colonização do país pelos portugueses. “Imaginemos neste Estado imenso de 8,5 milhões de quilômetros quadrados e todo mundo se apropriando à vontade, sem cerimônia do que era público, praticando o mais desbragado patrimonialismo, nepotismo, indistinção absoluta entre o público e o privado. Imaginemos o que não surgiu de cumplicidade, de complacência, de vista grossa, de leniência, de impunidade, esse caldo de cultura não nos favorece até hoje. Então, a corrupção no Brasil é endêmica, é renitente, é persistente, é capilarizada, faz parte de uma mentalidade coletiva”, afirma.

O coordenador da Frente Parlamentar de Combate à Corrupção, deputado Francisco Praciano (PT-AM), destaca que o alto índice de percepção da corrupção afeta o país econômica e socialmente. “Representa um volume muito grande de recursos retirados da sociedade brasileira: são R$ 100 bilhões. O mundo se preocupa com isso, não somos só nós. O motivo principal: a corrupção atrapalha o investimento, torna-o menos atrativo, degrada o ambiente de negócio, tem impactos econômicos nos juros. Então, é uma coisa realmente que se espraia, os resultados da corrupção, pela sociedade e pelo Estado.”

Arquivo/Gustavo Lima
Antonio Carlos Mendes Thame
Mendes Thame: se não houver instituições fortes, as leis não adiantam nada.
 

Legislativos de todo o mundo reuniram-se para combater o problema por meio da Organização Global de Parlamentares Contra a Corrupção (Gopac). Diretor da organização no Brasil, o deputado federal Antonio Carlos Mendes Thame (PSDB-SP) chama a atenção para as ferramentas de combate ao problema. “Leis, as melhores possíveis, se não houver instituições fortes, não adiantam nada. E também o contrário: se tivermos fortes instituições, mas não tivermos uma legislação boa – já que nós todos somos subordinados à lei, que deve valer igualmente para todos –, essa força das instituições se perde no vazio.”

Punição
Para cada preso por corrupção no País, há cem encarcerados por furto ou roubo, de acordo com estatística do Departamento Penitenciário Nacional. O promotor de Justiça Douglas Fischer lamenta que a corrupção ainda seja pouco punida no Brasil.

Ele avalia que a punição dos culpados deveria ter função preventiva para inibir novos delitos, principalmente pelo dano coletivo que causam à sociedade. “Há estudos que indicam que em torno de 96% dos danos à sociedade são causados por crimes de colarinho branco, aí incluídos os delitos de corrupção e correlatos, e apenas 4% relacionados com a tradicional delinquência que nós vemos hoje assoberbando nossos cárceres, especialmente no Brasil”, diz.

Arquivo/Gustavo Lima
Francisco Praciano
Francisco Praciano: resultados da corrupção se espraiam pela sociedade e pelo Estado.
 

Entre as causas dessa impunidade, Fischer reclama da morosidade do processo penal, que admite inúmeros recursos, a maioria apenas protelatória. Na visão dele, a legislação deveria ser modificada para impedir o uso desses mecanismos.

A deficiência estrutural da Justiça criminal brasileira, sobretudo em processos de lavagem de dinheiro, dificulta ainda o acesso e a repatriação do dinheiro desviado pela corrupção. Dados do Ministério da Justiça apontam que, nos últimos dez anos, R$ 35 milhões, entre dinheiro, propriedades e ações, foram repatriados, mas ainda há R$ 700 milhões bloqueados em outros países.

Uma subcomissão da Comissão de Fiscalização Financeira e Controle da Câmara dos Deputados será criada para apresentar, até o fim do ano, um conjunto de projetos que altere a legislação atual para facilitar a recuperação desses ativos.