Perdão de R$ 2 bilhões para os planos de saúde
A emenda que determina um teto para a aplicação de multas aos planos de saúde, incluída na medida provisória 627 sobre tributação de empresas no exterior, vai representar um perdão de R$ 2 bilhões para as operadoras. Segundo o Ministério da Saúde, o benefício se aplica também ao estoque das multas já aplicadas. O valor refere-se à estimativa das punições a serem aplicadas este ano e à redução no estoque.
A emenda foi incluída pelo líder do PMDB e relator da MP na Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), conforme informou O GLOBO na última quinta-feira.
— O governo brasileiro se posiciona contra a inclusão desse artigo na medida provisória porque entende que ele vai trazer muito prejuízo para mais de 50 milhões de brasileiros que têm plano de saúde, na medida em que prejudica muito a capacidade de fiscalização da ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar). Essa emenda perdoa cerca de R$ 2 bilhões em multas emitidas contra as operadoras, e isso não ajuda em nada a melhorar o sistema de saúde suplementar — afirmou o ministro da Saúde, Arthur Chioro.
Os planos de saúde protelam ao máximo o pagamento de multas. Levantamento exclusivo feito pela ANS a pedido do GLOBO mostra que de R$ 1,017 bilhão de multas aplicadas de 2009 a 2013, apenas R$ 157,9 milhões foram pagos, ou 15,5% do total.
E a decisão sobre se a emenda valerá ou não deve ficar para a presidente Dilma Rousseff. Com o prazo apertado para votar a MP 627, começou no Senado uma articulação para levar o projeto ao plenário na semana que vem.
A tendência do relator, senador Romero Jucá (PMDB-RR), é não alterar o texto aprovado na Câmara na semana passada. Com isso, seria mantida a emenda que reduz as multas aplicadas às operadoras por negar um atendimento por exemplo.
Jucá adiantou que os parlamentares enfrentam “um problema de prazo”, uma vez que a medida provisória perde a validade no dia 21.
— Dependendo da data que for programada para votação aqui, essa medida provisória poderá ter que ser votada da forma como está e o governo ajustar o texto com vetos — disse Jucá. — Se eu modificar e retirar qualquer dispositivo aqui no Senado, a MP volta à Câmara. Ela é muito importante para a economia brasileira, não podemos correr o risco de derrubar essa medida provisória.
Jucá se reuniu na terça-feira com Eduardo Cunha. Na conversa reservada, os dois parlamentares ponderaram que a repercussão negativa da emenda pode pressionar para mudar o relatório:
— É um dispositivo que ainda não está acertado com o governo, passível de veto. a proposta deve ser votada na semana que vem — disse Jucá.
Parlamentares da oposição devem pedir a rejeição do dispositivo. O senador Álvaro Dias (PSDB-PR) disse que apresentará um destaque:
— Certamente, os governistas alegarão que nós não podemos alterar a MP porque ela acabará arquivada, e certamente prometerão que a presidente Dilma vai vetar esta emenda. De qualquer sorte, nós votaremos contra ela.
50 infrações equivalem a duas
Pela regra atual, a operada é multada por cada infração cometida. Com o benefício incluído na MP, é estabelecido um teto de no máximo o valor de 20 multas. Hoje, se a operadora cometer mil infrações receberá multa de R$ 4 milhões, se a regra nova passar, vai pagar R$ 160 mil.
Para o diretor do Departamento de Proteção e Defesa do Consumidor (DPDC), Amaury Oliva, a proposta abre um precedente perigoso:
— A medida cria descrédito sobre o próprio trabalho da agência reguladora.
A presidente da Associação dos Procons do Brasil, Gisela Simona, disse que Procons, Ministério Público, Defensoria Pública e entidades civis vão formalizar no Congresso pedido para que a mudança seja retirada do texto da MP 627.
— Essa redução do valor das multas é um retrocesso, enfraquece o poder de fiscalização.
O professor do Departamento de Medicina Preventiva da USP Mário Scheffer afirma que fixar teto para multas vai estimular mais infrações:
— É um passaporte para que os planos cometam infrações. É mais problemático porque a infração mais recorrente é a de exclusão de cobertura.
Professor da UFRJ e ex-conselheiro do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), Luiz Carlos Prado lembra que a multa nunca pode ser inferior ao benefício auferido pela empresa.
— Isso não passaria em lugar nenhum do mundo em ano eleitoral.
Associação Brasileira de Medicina de Grupo (Abramge) e Federação Nacional de Saúde Suplementar (Fenasaúde), só vão se manifestar após a tramitação final da MP.