Roberto Barroso: ‘Sem reforma política, tudo continuará como sempre foi’

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Em sua primeira participação no julgamento do mensalão, o ministro Roberto Barroso disse que as condenações impostas pelo Supremo Tribunal Federal são uma forma de repúdio ao modelo político atual. Para ele, a corrupção é resultado de um sistema político centrado no dinheiro – e não pode, portanto, ser atribuída solitariamente ao PT, ao PSDB ou ao PMDB:

– Não há corrupção melhor ou pior. Dos “nossos” ou dos “deles”. Não há corrupção do bem. A corrupção é um mal em si e não deve ser politizada.

Como solução, ele defendeu a reforma política:

– A imensa energia jurisdicional dispendida no julgamento da AP 470 terá sido em vão se não forem tomadas providências urgentes de reforma do modelo político, tanto do sistema eleitoral, quanto do sistema partidário. É preciso fazê-la, com os propósitos enunciados: barateamento das eleições, autenticidade partidária e formação de maiorias políticas consistentes. Ninguém deve supor que os costumes políticos serão regenerados com direito penal, repressão e prisões. Sem reforma política, tudo continuará como sempre foi. A distinção será apenas entre os que foram pegos e outros tantos que não foram.

Barroso afirmou que não concorda com todas as teses vencedoras no julgamento, alertou para a existência de penas desequilibradas e considerou as condenações uma catarse que atendeu o anseio popular de punição aos corruptos.

No ano passado, o STF condenou 25 dos 37 réus em quatro meses e meio de sessões plenárias. Barroso não participou do julgamento, pois tomou posse no tribunal em junho.

O ministro também mencionou que a média de custo de uma campanha para deputado federal é de R$ 4 milhões, valor pelo menos quatro vezes maior que os salários recebidos por um parlamentar num mandato:

– Com esses números, não há como a política viver, estritamente, sob o signo do interesse público. Ela se transforma em um negócio, uma busca voraz por recursos públicos e privados. Nesse ambiente, proliferam as mazelas do financiamento eleitoral não contabilizado, as emendas orçamentárias para fins privados, a venda de facilidades legislativas.

O ministro reclamou das penas fixadas pelos colegas para os condenados do mensalão, no ano passado:

– Não acho que tenha sido feliz, com respeito, a decisão de que os ministros que votaram pela absolvição não puderam participar da dosimetria (cálculo das penas). Acho que provocou exacerbação das penas.

Barroso afirmou que o mensalão, ocorrido no governo do PT, não é o caso de corrupção mais grave da História recente do país. Mas o escândalo foi, segundo ele, o mais investigado:

– É impossível exagerar a gravidade e o caráter pernicioso de tudo o que aconteceu. Porém, a bem da verdade, é no mínimo questionável a afirmação de se tratar do maior escândalo político da História do país. Talvez o que se possa afirmar é que foi o mais investigado de todos, seja pelo MP, pela PF ou pela imprensa. Assim como foi, também, o que teve a resposta mais contundente do Poder Judiciário.

O ministro lembrou casos de corrupção que mobilizaram o país: os anões do orçamento, em 1993; os precatórios, em 1997; o superfaturamento do prédio do TRT de São Paulo, em 99; e o Banestado, em 2003.

Ele disse que o resultado do julgamento determina um novo parâmetro para as atitudes das pessoas não só na política, mas na vida cotidiana. Ele defendeu a decência “em pequenas coisas”, como levar o cachorro para fazer necessidades na praia, sabendo que crianças a frequentam. O ministro citou pessoas que estacionam o carro na calçada, fraudam licitações, dirigem embriagadas e jogam lixo na rua. (Carolina Brígido e André de Souza)