Próxima batalha

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Nas Entrelinhas
Autor(es): Denise Rothenburg

O Orçamento promete ser a nova fonte de dores de cabeça do governo no Congresso, seja pela dificuldade de aprovar créditos suplementares para as mais diversas áreas, seja por causa do Orçamento impositivo, a proposta que pretende tornar automática a execução das obras que os deputados e os senadores indicam na previsão de gastos, as tais emendas. Estudos jurídicos do Ministério do Planejamento indicam inconstitucionalidades na proposta. Mas os deputados que elaboram as leis, inclusive a Constituição, não veem assim. Esse assunto, aliás, estava incluído na pauta de discussões ontem entre Dilma Rousseff, o vice-presidente Michel Temer e os presidentes do senado, Renan Calheiros, e da Câmara, Henrique Eduardo Alves.

Na visão dos parlamentares, o Orçamento é, hoje, a única lei feita para não ser cumprida. Deputados e senadores passam madrugadas no fim do ano votando a Lei Orçamentária, fechando números. Mas a maioria que faz esse trabalho tem a certeza de que, meses depois, o grosso das sugestões feitas por eles será tratado como lixo pelo governo. E em todos os ministérios.

Para você que não se lembra do decreto de reprogramação orçamentária, anunciado no mês passado pelo Ministério do Planejamento, vale lembrar que, do bloqueio de R$ 28 bilhões feito na previsão de gastos do governo, R$ 15,6 bilhões se referem a essas emendas de deputados, senadores, bancadas estaduais e comissões técnicas da Câmara e do Senado. Só no Ministério das Cidades, a represa, chamada de contingenciamento, foi de R$ 5,02 bilhões, sendo R$ 4,2 bilhões em emendas incluídas ali por parlamentares. Ou seja, os políticos que apresentaram emendas por ali vão passar o resto do ano à espera de um milagre econômico que permita ao governo retomar essas despesas. No Orçamento da União como um todo, de R$ 22 bilhões em emendas, apenas R$ 7 bilhões prosseguem com perspectiva da liberação até o fim do ano.

O anúncio desses números foi um dos motivos da série de tropeçadas da articulação política. Além disso, o decreto saiu publicado justamente num momento em que a presidente Dilma precisava de votos para aprovar as duas medidas provisórias que estavam em tramitação naquela semana. As medidas acabaram caindo, e a opção para garantir a redução das tarifas de energia foi a lambança de colocar os artigos da medida provisória original dentro de outra, o que, segundo alguns, arrisca virar objeto de alguma reclamação no Supremo Tribunal Federal.

Com a maioria das emendas contingenciadas, a base política do governo simplesmente perde o entusiasmo em ajudar o governo e parte para o chamado Orçamento impositivo. Afinal, o chamado “baixo clero”, a maioria dos deputados, considera hoje que Dilma não lhes dá atenção, não chama para inaugurações de obras em suas bases eleitorais, não lhes deixa sequer apadrinhar projetos de lei. “Ela não me prestigia, por que raios eu devo votar com o governo?”, é frase repetida no plenário como um refrão dessas músicas que grudam e o sujeito sai cantando dia e noite.

Se, além desse jeitão presidencial meio distante, o governo ainda decidir enfrentar os parlamentares no quesito Orçamento impositivo, certamente, os problemas na base vão se agravar. Uma reclamação ao STF, por exemplo, só tende a acirrar o clima ruim. Portanto, reza a prudência, é melhor negociar desde já uma saída para que a parte do Orçamento sujeita à liberação automática seja a menor possível. Afinal, seguro morreu de velho.

Enquanto isso, na Vice-Presidência da República…
Em nada vai adiantar a presidente Dilma pedir ao vice-presidente Michel Temer que negocie desde já essa proposta de emenda constitucional a respeito do Orçamento impositivo em estudo na Câmara. Neste mês, Temer viajará à Turquia, a Israel e, ainda, fará uma visita à Autoridade Palestina. Menos um anteparo para ajudar Dilma a cuidar da “Faixa de Gaza” congressual por aqui.

E no segundo andar do Planalto…
Reaberta a temporada de solenidades. Vem aí o Plano de Saneamento, o Plano Safra, o PAC do Turismo e o pacote de incentivo à indústria de eletrodomésticos. Desta vez, entretanto, a ideia é baixar a Contribuição para Financiamento da Seguridade Social (Cofins). Essa é exclusiva da União. Tudo o que o governo não quer é dar mais motivos para os estados baterem à sua porta pedindo renegociação de dívidas por redução de receita.