Um retrocesso nas contas públicas

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Época – 11/03/2013

 

 

No discurso das autoridades e na propaganda oficial, o governo federal aparece como um exemplo de austeridade fiscal. A presidente Dilma Rousseff não se cansa de exaltar a eficiência com que as administrações petistas conseguiram reduzir a dívida pública de 60,4% do Produto Interno Bruto (PIB), em 2002, para 35,1%, em 2012, segundo dados do Banco Central. A realidade, porém, destoa do cenário idílico desenhado pelo Palácio do Planalto.

O exemplo mais gritante da criatividade contábil do governo é um mecanismo comparável à velha conta movimento, extinta oficialmente em 1986. Por meio dela, o Banco Central mantinha uma relação incestuosa com o Banco do Brasil. Fornecia recursos sem lastro para irrigar a política de crédito do governo – uma manobra apontada como uma das causas da superinflação dos anos 1980 e 1990.

Agora, a conta movimento ressurge sob nova roupagem. Tem a missão de irrigar a economia com financiamentos de longo prazo, de acordo com um artigo do ex-presidente do Banco Central Gustavo Loyola publicado pelo jornal Valor Econômico. Hoje, o dinheiro não vem mais do Banco Central, mas da emissão de dívida pública federal. Ele é repassado às empresas, principalmente de grande porte, pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).

O governo capta os recursos do público por meio da emissão de títulos, repassa o dinheiro ao BNDES como um empréstimo e neutraliza, assim, o efeito negativo da captação nas contas públicas, uma vez que aparece como credor da instituição. Na prática, o BNDES nada mais é que um braço financeiro do governo. Só nos últimos cinco anos, os empréstimos do Tesouro Nacional para os bancos públicos cresceram de R$ 14 bilhões (0,5% do PIB) para RS 406 bilhões (9,2% do PIB). No final de 2007, apenas 15% do passivo do BNDES correspondia a empréstimos do Tesouro Nacional. Hoje, são 55%. Esse número deverá crescer ainda mais, caso se confirme a promessa do governo de realizar novo repasse de R$ 8 bilhões para o BNDES em 2013.

Num momento em que o governo federal quer recuperar a confiança dos empresários brasileiros e atrair os investidores externos para melhorar a infraestrutura do país, esse tipo de esperteza contábil, semelhante ao que o governo usou no final do ano passado para elevar o superávit primário, certamente não ajuda. Se quiser seduzir o capital nacional e internacional, o país precisa adotar a transparência e os princípios contábeis aceitos pelos economistas em suas contas e cm sua gestão financeira.