Endividamento dos Estados fez minguar superávit fiscal

297

Valor Econômico – 07/02/2013

 

 

 O Tesouro Nacional colocou nos ombros de Estados e municípios boa parte da responsabilidade pelo fato de o governo não ter feito o superávit primário consolidado de R$ 139,8 bilhões prometido para 2012. A contribuição esperada dos Estados e municípios para esse resultado era de R$ 42,8 bilhões, mas o valor efetivamente obtido ficou na metade, R$ 21,5 bilhões. Foi necessário então correr no fim de ano e apelar para uma série de manobras contábeis para fechar as contas. O próprio governo central havia se comprometido com R$ 97 bilhões e conseguiu R$ 86,1 bilhões após resgatar o Fundo Soberano e antecipar o que fosse possível em dividendos de estatais.

No entanto, não é segredo que, desde o início da crise internacional, o resultado primário dos governos regionais vem caindo em consequência da redução do nível de atividades, da diminuição das receitas e do aumento das despesas, especialmente de pessoal. No ano passado, houve o agravante das eleições municipais, que sempre aumentam as despesas. O fato é que o superávit primário dos governos regionais caiu pela metade entre 2008 e 2012, de 1% para 0,49% do Produto Interno Bruto (PIB), em valores, de R$ 30,6 bilhões para R$ 21,5 bilhões. No caso dos Estados, o superávit diminuiu de 0,88% para 0,43% do PIB (de R$ 25,9 bilhões para R$ 18,8 bilhões) no mesmo período.

Reportagem do Valor (31/1) mostra que vários Estados já esperavam resultado primário menor no ano passado, previsão registrada – e cumprida – na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO). O Estado do Rio de Janeiro fechou o ano com déficit primário de R$ 552,2 milhões, mas já esperava um resultado negativo de pelo menos o dobro. O Estado de Minas Gerais teve superávit primário de R$ 3,1 bilhões, muito perto da meta de R$ 3,2 bilhões. Já o Estado de São Paulo fechou 2012 com superávit de R$ 6,48 bilhões, valor 4,7% maior que o resultado do ano anterior, e acima da meta de R$ 4,5 bilhões definida na sua LDO.

Não raras vezes, o déficit foi resultado do aumento dos investimentos calcado em dívidas feitas pelos Estados, incentivadas pelo próprio governo federal. Incapaz de destravar seus próprios investimentos e empenhada em estimular a economia, Brasília tomou uma série de medidas na virada do primeiro semestre de 2012 para alavancar a expansão dos Estados.

Uma delas foi a ampliação do limite do endividamento dos Estados dentro do Programa de Ajuste Fiscal (PAF), respeitando a LDO. A medida foi apresentada como uma compensação para a perda de receita causada pelas desonerações tributárias feitas pelo governo federal, que esvaziou o Fundo de Participação dos Estados (FPE), mas também tem como objetivo canalizar recursos para a infraestrutura. O governo federal já havia tomado esse tipo de medida em 2008 e 2009, no auge da crise internacional. A consultoria LCA calcula que, no total, 23 Estados receberam autorização do Tesouro para ampliar o endividamento em até R$ 61,1 bilhões. Apenas no ano passado, 17 Estados foram autorizados a tomar R$ 42,2 bilhões.

Com os limites ampliados, os Estados podem se endividar junto a agências internacionais, como o Banco Mundial, e se candidatar à nova linha de crédito de R$ 20 bilhões, criada especialmente para os governos regionais no ano passado pelo BNDES, a Proinveste, com 20 anos de prazo de pagamento e juros quase negativos (TJLP mais 1,1% ao ano).

Vários Estados aproveitaram as novas facilidades. O governo do Estado de São Paulo, por exemplo, apelou para o Proinveste para as obras das linhas 5 e 12 do metrô da capital, para a recuperação de 900 quilômetros de estradas e a compra de trens para a CPTM. O Estado do Rio também vem investindo bastante, inclusive para preparar-se para a Olimpíada e Copa do Mundo, e esse foi o motivo do déficit primário registrado em 2012, quando as receitas primárias correntes aumentaram 5,2%, as despesas correntes subiram 11% e os investimentos liquidados, porém, cresceram ainda mais, 12,5%.

Mas há um grande problema contábil que afeta as contas fiscais quando os investimentos são bancados por empréstimos: o dinheiro que entra não é contabilizado como receita, mas o que sai é registrado como despesa.

O impacto é fulminante no resultado primário e deverá se repetir com mais intensidade neste ano, quando os Estados vão efetivamente sentir os efeitos dos estímulos concedidos, que foram apenas parciais em 2012 porque estavam limitados pela legislação eleitoral e pelos tetos fiscais. E não dá para o Tesouro alegar nova surpresa ao fechar as contas no fim do ano.