Queda do superávit e falta de transparência na área fiscal

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Valor Econômico – 26/11/2012

 

O superávit primário das contas públicas, um dos pilares da política econômica, será menor, em 2012, que o previsto tanto pelo governo quanto pelo mercado. Ao divulgar o relatório de avaliação de receitas e despesas do quinto bimestre do ano, o Ministério do Planejamento informou que abaterá, do cálculo do superávit, R$ 25,6 bilhões da meta original.

Esse desconto equivale a um volume de recursos superior a 0,5% do Produto Interno Bruto (PIB). Somando-se esse abatimento à diminuição da contribuição de Estados e municípios para o esforço fiscal, chega-se a uma redução de R$ 40 bilhões. O montante representa 28,61% da meta de superávit primário fixada na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) deste ano.

LDO determinou que, em 2012, o setor público (União, governos estaduais e prefeituras) economizasse, sem considerar os gastos com juros da dívida pública, R$ 139,8 bilhões (3,1% do PIB). Do total, 69,36% deveriam ser gerados pelo governo federal.

Ao longo do ano, ficou claro, apesar dos repetidos e enfadonhos desmentidos de autoridades, que o governo não cumpriria a meta fiscal. Além da frustração de receita, provocada em parte pelas desonerações de impostos, mas também pelo desaquecimento da economia, houve forte aumento de gastos, comprometendo o equilíbrio fiscal.

Somente há duas semanas, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, reconheceu que o governo lançaria mão da possibilidade, prevista em lei, de descontar do cálculo do superávit os investimentos no âmbito do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). Foi o que o Ministério do Planejamento oficializou na semana que passou.

É curioso observar que, quando a União não cumpre o superávit primário, Estados e municípios também não o fazem. Da meta inicial de R$ 42,85 bilhões, vão entregar apenas R$ 28 bilhões. Com isso, o superávit do setor público consolidado ficará em torno de R$ 99,5 bilhões ou 2,2% do PIB, uma queda de 0,9 ponto percentual em relação à meta fixada pela LDO. O mercado trabalhava, até a semana passada, com hipótese de redução do superávit primário para cerca de 2,6% do PIB.

Mesmo valendo-se de descontos, ainda assim, o governo pode não atingir a meta. Pelas regras vigentes, Brasília teria que realizar, na integralidade, os investimentos do PAC a serem descontados da contabilidade do superávit. De janeiro a setembro, foram desembolsados R$ 24,3 bilhões e, no acumulado em 12 meses até aquele mês, R$ 34,3 bilhões. É difícil acreditar que, em apenas três meses, o governo consiga investir quase R$ 16 bilhões.

Além do descumprimento do esforço fiscal, chama a atenção informação trazida pelo relatório de despesas e receitas do quinto bimestre. O documento informou que a previsão das despesas obrigatórias da União em 2012 subiu R$ 16,5 bilhões, quando comparadas com o relatório anterior, do quarto bimestre. Os gastos, principalmente os de natureza previdenciária, saltaram de R$ 589,2 bilhões para R$ 605,7 bilhões, um incremento de 16,5 bilhões.

A questão, nesse caso, é de falta de transparência. É evidente que o governo não descobriu somente agora que as despesas com previdência e assistência social seriam maiores. A bem da verdade, desde a confecção do orçamento de 2012 ficou claro que houve omissão de despesas para beneficiar as emendas individuais de parlamentares. O governo sabia disso e nada fez ao longo do ano, provavelmente para não admitir já bem cedo que não cumpriria o superávit.

Uma das maiores conquistas do país na última década e meia foi o equilíbrio das contas públicas, avanço crucial para assegurar a solvência do Estado brasileiro, condição sine qua non, por sua vez, para a estabilidade de preços. Depois de sofrer os efeitos de quase duas décadas da crise da dívida, com histórico de calotes e confiscos, o Brasil fez opção firme pelo equilíbrio fiscal a partir de 1999.

A persistência nesse caminho fez o país normalizar suas relações com a comunidade financeira internacional, obtendo das agências de classificação de risco o grau de investimento. Além de contribuir para a redução da dívida pública, o superávit primário auxilia o Banco Central a controlar a demanda agregada e, portanto, a inflação. Infelizmente, nos últimos quatro anos, o governo cumpriu o superávit em apenas um (2011). O pior é que está deixando de atingir a meta fiscal sem conseguir elevar os investimentos em infraestrutura, tão importantes para a redução dos gargalos que encarecem o custo de produção.