O avanço dos apadrinhados

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Autor(es): SÍLVIO RIBAS

Correio Braziliense – 14/11/2012

 

 

Municípios incham as máquinas públicas. Em quase a metade deles, a contratação é feita sem concursos. Obras são sacrificadas

 

A máquina pública das cidades do país ficou mais inchada nos últimos dois anos, atingindo a marca de 5,96 milhões de servidores em 2011. Se considerar apenas os funcionários lotados nas prefeituras e seus órgãos administrativos, a chamada administração direta, o aumento no número de efetivos em relação a 2009 foi de 4,8%, alcançando 5,64 milhões.

Os dados sobre o perfil de gestão dos municípios estão em estudo divulgado ontem pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Se considerar apenas os cargos comissionados, o aumento no período foi de 9,5%, com quase meio milhão de pessoas contratadas sem concurso, ou seja, por meio de indicação política, na maioria dos casos. Delas, 47% têm nível de escolaridade médio e 26%, nível superior. É na região Norte onde os prefeitos mais ampliam a máquina por meio de apadrinhados — o avanço nas contratações foi de 15%.

Com as folhas de salários cada vez mais pesadas, restam poucos recursos para os municípios investirem em áreas prioritárias, como saúde e educação. Obras de infraestrutura são escassas. Em mais de 93% das cidades não há ações preventivas contra tragédias naturais, conforme revela a Pesquisa de Informações Básicas Municipais (Munic 2011).

“Os números mostram que as administrações municipais ainda seguem uma lógica política na aplicação de seus recursos e na organização do setor público local”, analisa Sérgio Giovanetti Lazzarini, professor titular do Insper. “Na falta de uma maior cobrança da população, os gestores também se sentem desobrigados a oferecer metas que justifiquem as contratações”, completa.

Os municípios do Pará são exemplo claro disso. Abriram e preencheram 20 mil cargos por indicação. Em números absolutos, as cidades dos estados de São Paulo e Rio de Janeiro têm o maior número de funcionários de prefeituras nesse perfil, respectivamente 57 mil e 42 mil. A Bahia vem em terceiro: 41 mil cargos.

O IBGE constatou que as contratações sem concurso avançaram, sobretudo, na chamada administração indireta, que abrange empresas, autarquias e fundações municipais. O total de servidores comissionados nessas instituições cresceu 12,1% em todo o país apenas entre 2009 e 2011. Nos municípios de pequeno porte, com população de 5 mil a 10 mil habitantes, esse tipo de contratação disparou 59,9%. A realidade é constrangedora se considerar que o nível municipal é o mais pressionado na repartição do bolo tributário nacional, concentrado na União. Os prefeitos, inclusive, têm gritado contra a redução dos repasses federais por causa das desonerações feitas pelo Palácio do Planalto.

A revelação de inchaço na máquina pública municipal se choca com o baixo investimento em serviços públicos básicos, como tratamento de água e limpeza urbana. “Verificamos a continuidade do quadro restrito em infraestrutura e prevenção contra enchentes e outros desastres naturais, mas um avanço institucional com a consolidação de programas sociais e de garantias de direitos humanos”, diz Vânia Pacheco, coordenadora da pesquisa do IBGE. 

A maioria dos servidores municipais em todo o país trabalha na administração direta (94,6%) e o restante (5,4%), na indireta. Mas a forma de contratação difere muito nos dois grupos. Na administração direta, 3,59 milhões servidores, ou 63,7% do total, são regidos pelo regime estatutário (têm estabilidade no emprego). O destaque regional é o Centro-Oeste, com 350,5 mil, ou 72,3% do universo, puxada pelo Distrito Federal, com 84,7% ou 86.939 servidores efetivos. Em seguida vem o Sul, com 531,3 mil (70,2%), e o Nordeste, com 1,15 milhão (62,5%). O IBGE ressaltou ainda que as cidades do Acre (35,6%) e de São Paulo (27,9%) têm, respectivamente, os maiores índices de funcionários contratados com carteira assinada, seguindo a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT).

A pesquisa também avaliou o nível de escolaridade dos servidores municipais: 38% têm ensino médio e 20,7%, fundamental. Os funcionários públicos com nível superior são, por sua vez, 25,9% e os com pós-graduação, apenas 6,1%. São Paulo e Distrito Federal são as unidades com mais servidores com curso superior do que de nível médio. Funcionários públicos sem instrução formal somam 1,7% e estão concentrados no Nordeste e Sudeste.