Gasto com juro diminui, mas a despesa corrente aumenta

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Valor Econômico – 31/01/2013

 

 

Os resultados da alquimia de fim de ano do governo nas contas fiscais ficaram finalmente escancarados nos números divulgados nos últimos dias pelo Tesouro e pelo Banco Central (BC). Apesar das tão criticadas manobras feitas para o cumprimento das metas, o governo teve que apelar para o desconto permitido em lei dos desembolsos feitos no Programa de Aceleração do Crescimento (PAC).

O superávit primário consolidado divulgado ontem acabou ficando em R$ 104,951 bilhões em 2012, equivalente a 2,38% do Produto Interno Bruto (PIB), R$ 34,8 bilhões a menos da meta do ano, estabelecida em R$ 139,8 bilhões pela Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), e inferior aos R$ 128,7 bilhões de 2011. A mesma lei permitia que fosse deduzida da meta até R$ 40,6 bilhões investidos no PAC, desde que efetivamente realizados. O governo disse que deduziria apenas R$ 25,4 bilhões. Mas não pôde cumprir também essa meta e teve que apelar ao abatimento dos R$ 39,3 bilhões que acabaram sendo realmente investidos no PAC.

No apagar das luzes do ano, nada menos do que R$ 12,4 bilhões foram sacados do Fundo Soberano Brasileiro e R$ 7,6 bilhões em dividendos de estatais foram antecipados apenas em dezembro, totalizando R$ 28 bilhões no ano, para fechar as contas. Apesar do esforço, o governo central fechou o ano com superávit fiscal de R$ 86,086 bilhões, distante da meta de R$ 97 bilhões. Os Estados e municípios cumpriram cerca de metade da meta, com R$ 21,511 bilhões; e as estatais apresentaram déficit de R$ 2,645 bilhões.

O crescimento das despesas em ritmo superior ao das receitas foi em boa parte responsável por esse quadro. O governo aproveitou o espaço criado pela queda da taxa Selic e da inflação, que diminuiu a despesa com juros de 5,71% para 4,85% do Produto Interno Bruto (PIB), o menor da série histórica, de R$ 236,7 bilhões para R$ 213,9 bilhões. As despesas do Tesouro cresceram 11,1% no ano passado, com destaque para a expansão de 14,8% no custeio e capital. Mas as receitas aumentaram menos, 7,7%, afetadas pelo fraco crescimento econômico e pelas desonerações feitas pelo governo para tentar estimular o nível de atividades. A Receita Federal calcula as desonerações feitas em R$ 46,44 bilhões em 2012. Ao zerar a Cide dos combustíveis para que o aumento da gasolina não chegasse ao consumidor e, portanto, à inflação, o governo abriu mão de cerca de R$ 6,2 bilhões. Diminuíram também as receitas com IPI, com a redução da incidência sobre automóveis, eletrodomésticos da linha branca e outros bens.

Mas, para o governo, a frustração das receitas de Estados e municípios teria sido a responsável pelo atropelamento no fechamento das contas fiscais de 2012. Quando os Estados não cumprem sua meta fiscal, que é de 0,95% do PIB, o governo federal é obrigado a compensar a frustração ocorrida. Essa correria, que exigiu até edição extra do Diário Oficial e provocou a sensação de que manobras não ortodoxas estavam sendo engendradas, teria sido desnecessária caso o governo tivesse prestado atenção nas contas dos governos estaduais.

O menor superávit primário dos Estados também foi em parte resultado do crescimento das despesas correntes maior do que o das receitas correntes, como aconteceu com o governo central. Em cinco Estados pesquisados pelo Valor, porém, isso também foi motivado pelo aumento dos investimentos, o que havia sido estimulado pelo próprio governo federal, com a flexibilização do Programa de Reestruturação e Ajuste Fiscal (PAF) e autorização para um endividamento maior. Foram também autorizadas novas operações de crédito para os Estados no montante de R$ 20 bilhões, por meio do Programa de Investimento (Proinveste). Ao ampliar os investimentos financiados por empréstimos, os Estados acabam tendo uma pressão maior sobre o resultado primário porque os recursos dos financiamentos não são contabilizados para o cálculo de resultado primário, mas as despesas geradas pelos investimentos sim.

O Valor apurou que vários Estados já haviam sinalizado nesses documentos, formulados em 2011, que dariam menor contribuição para o resultado primário de 2012. Entre os dez Estados de maior arrecadação, cinco – Rio de Janeiro, Espírito Santo, Rio Grande do Sul, Pernambuco e Goiás – indicaram nos orçamentos de 2012 metas menores do que as de 2011. E sete entre os dez – São Paulo, Rio, Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná, Pernambuco e Goiás – resultados primários menores do que os do mesmo período de 2011 já no balanço acumulado até outubro.