Alta da inflação não é temporária, admite BC

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Autor(es): » VICTOR MARTINS

Correio Braziliense – 15/03/2013

 

 

Autoridade monetária alerta para os riscos de aumento dos preços e diz que os índices podem ter se acomodado em patamar mais elevado, mas afirma que é preciso cautela para subir as taxas de juros

Ameaçado por uma inflação que, ainda este mês, pode romper a variação anual de 6,5% estabelecida como limite de tolerância pelo governo, o Banco Central admitiu a gravidade da situação e mandou um recado: pode subir os juros se o custo de vida piorar. A informação consta da ata da última reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), divulgada ontem. O documento vai além e afirma ainda que a recente alta dos preços pode não ser temporária, mas uma acomodação dos índices em patamares mais elevados — e mais resistentes à queda. Apesar desse cenário, o BC prega cautela quanto a um eventual aumento da Selic, atualmente em 7,25% ao ano. Para usar o remédio dos juros, a instituição precisa vencer resistências dentro do próprio Executivo, sobretudo porque um dos desejos da presidente Dilma Rousseff é deixar como legado as menores taxas da história.

No parágrafo 28 da ata, o BC deixa claro o incômodo com o nível atual do Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), que teima em não ceder apesar dos cortes de tributos promovidos pelo Ministério da Fazenda. A instituição explica que a maioria dos preços está em alta e que essa pressão tem sido intensificada por alguns fatores pontuais no segmento de transportes — uma referência à reversão do desconto do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) para veículos e elevações de tarifas de transporte público. “Embora essa dinâmica desfavorável possa não representar um fenômeno temporário, mas uma eventual acomodação da inflação em patamar mais elevado, o Comitê pondera que incertezas remanescentes cercam o cenário prospectivo e recomendam que a política monetária deva ser administrada com cautela”, diz o texto.

Riscos

Apesar de todos os alertas, a autoridade monetária mostrou um otimismo em outros trechos do documento. “O grau de persistência das atuais pressões inflacionárias não parece claro para o BC”, avaliou Ilan Goldfajn, economista-chefe do Itaú Unibanco. Ele explicou que a instituição menciona a redução dos preços das commodities (produtos básicos com cotação internacional) como fator que pode aliviar o custo de vida. Além disso, fala de moderação na “dinâmica dos preços de certos ativos reais e financeiros” — uma referência à manutenção do dólar ao redor de R$ 2. “Em nossa avaliação, o Copom está propenso a elevar os juros se a inflação continuar pressionada, o que parece o cenário mais provável”, disse Goldfajn. “Mas caso haja alívio a curto prazo, o aperto monetário poderá inclusive não ocorrer”, afirmou.

Tamanha é a preocupação do BC com a carestia que a diretoria da casa inseriu um parágrafo na ata mencionando os problemas que uma alta de preços disseminada e persistente provoca na economia. No trecho, a autoridade monetária faz uma apelo velado à memória do brasileiro que viveu o período da hiperinflação, antes da estabilização obtida com o Plano Real. “O Copom ressalta que a evidência internacional, no que é ratificada pela experiência brasileira, indica que taxas de inflação elevadas geram distorções que levam a aumentos dos riscos e deprimem os investimentos”, destacou o BC.

Uma ala do governo combate a elevação de juros com o argumento de que a redução das taxas impulsionou o uso do crédito e o consumo no país. A avaliação é que mesmo com a carestia próxima do teto da meta, o custo de vida está sob controle e as altas de preços não vão descambar em uma superinflação, como no passado. Para esses técnicos, as desonerações da cesta básica, da energia, e outras medidas vão ajudar a conter os índices.

Para analistas do mercado financeiro e ex-integrantes do governo, é preciso cautela nessa estratégia. “As medidas tributárias afetam os preços a curto prazo, mas não mudam a tendência de inflação. Em algumas situações, elas podem até mesmo gerar mais demanda e, a médio e longo prazo, criar mais inflação”, argumentou Mauro Schneider, economista-chefe da corretora CGD Securities. Ele admitiu que a redução dos juros foi positiva, mas ponderou que a Selic está abaixo do ponto de equilíbrio que permitiria ao país crescer sem elevar a carestia.

Cesta básica ainda sobe
Mesmo com a desoneração da cesta básica, os itens de primeira necessidade ficaram 0,55% mais caros nesta semana, em São Paulo, em relação à semana passada. Segundo pesquisa do Procon-SP e do Departamento Intersindical de Estatísticas (Dieese), o preço médio da cesta passou de R$ 384,58 para R$ 386,71. Com alta de 0,67%, alimentação foi o que mais subiu.