Menor liberação de emendas pressiona por Orçamento impositivo

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A presidente Dilma Rousseff reduziu o pagamento de emendas individuais ao Orçamento da União feitas por parlamentares em comparação com o seu antecessor, Luiz Inácio Lula da Silva. Também aumentou o contingenciamento dessas emendas nos ministérios.

Em 2009, o petista pagou R$ 2 bilhões de restos a pagar de emendas individuais, valor que caiu para R$ 1,7 bilhão em 2010. No primeiro biênio de Dilma, os números foram de R$ 1 bilhão em 2011 e R$ 385,4 milhões em 2012. Os dados integram um amplo estudo que a Consultoria de Orçamento da Câmara prepara para subsidiar o presidente Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN) naquela que é a maior bandeira do seu mandato: a aprovação da proposta de emenda constitucional que estabelece o Orçamento impositivo. Por esse sistema, o Executivo é obrigado a liberar todos os recursos de emendas parlamentares aprovados pelo Legislativo. Diferentemente de hoje, em que o Orçamento, autorizativo, possibilita ao Executivo liberar os recursos de acordo com suas prioridades.

Mas o conhecido instinto de sobrevivência dos políticos fez com que eles mesmos se adaptassem e conseguissem, de acordo com seus Estados, partidos e relações, ter conhecimento sobre quais ministérios os atende melhor. A partir de dados obtidos com os próprios ministérios, é possível verificar que cada órgão se comporta de uma maneira em relação à liberação de emendas -e os parlamentares se adaptaram a isso. Não há uma regra geral. Há bons e maus pagadores na Esplanada, com estilos de atuação variados. Alguns preferem pagar apenas as emendas a que o relator-geral do Orçamento tem a prerrogativa legal de indicar. Outros atendem solicitações das comissões permanentes da Câmara e do Senado, as chamadas “emendas de comissão” – o que explica a intensa disputa política que há por esses cargos. Líderes de bancada e dirigentes partidários também são favorecidos. Em alguns locais, há forte influência regional, com domínio de um ou mais Estados. Há também o partidarismo. Ministros com preferência em liberar emendas para seus correligionários.

Ainda assim, esses perfis não são estáticos e podem se cruzar. Caso exemplar é o do Ministério das Cidades. Chefiada por Agnaldo Ribeiro (PP), a Pasta é dominada, em se tratando de emendas, por dois tipos de parlamentares: os filiados ao PP, partido do ministro, e os oriundos do Paraná, Estado da ministra da Casa Civil, Gleisi Hoffmann, pré-candidata ao governo estadual em 2014. Dos 19 contemplados com empenhos (compromisso de pagamento) de emendas em 2012, oito são do PP e 11 do Paraná. O recordista é Nelson Meurer (PP-PR), ex-líder da bancada, que junta as duas características.

Outro caso de sucesso é o do deputado Giacobo (PR-PR). Em 2012, conseguiu que fossem empenhados e pagos R$ 7 milhões, algo muito raro que só explica pelo fato de ele ser um dos mais próximo de Gleisi na Câmara. Mas a maior fatia das emendas do Paraná se dividem entre PT e PMDB, partido que os petistas tentam trazer para a coligação de Gleisi.

O Valor considerou as informações obtidas apenas referentes ao ano de 2012, cuja lei orçamentária foi votada e aprovada no governo Dilma. Considerando-se este ano, vê-se que os melhores ministérios para liberar emendas são Defesa, Desenvolvimento Social, Educação, Integração Nacional, Justiça, Saúde e Turismo.

Sem grande destaque no dia a dia da política, Defesa é um grande filão para parlamentares do Norte e do Nordeste devido ao programa de infraestrutura básica nos municipios da Calha Norte. O ex-líder do governo, Romero Jucá (PMDB-RR), por exemplo, atua bastante nessa Pasta, assim como o ex-líder do PR, Luciano Castro (PR-RR). Ambos se juntam a uma lista de parlamentares que aparecem em muitas planilhas de pagamentos. Alguns deles: o senador Benedito de Lira (PP-AL) e seu filho, Arthur Lira (PP-AL); Blairo Maggi (PR-MT), Ciro Nogueira (PP-PI), presidente do PP, e Valdir Raupp (PMDB-PP), vice-presidente do PMDB.

No entanto, a amostra aponta que o poder mesmo das emendas está com o relator-geral do Orçamento. Ainda mais quando se examinam órgãos por onde circula boa parte dos investimentos da União. Como o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit), onde o relator-geral predomina, seguido pelas bancadas regionais, comissões e só depois parlamentares individualmente. Isso explica porque o PR tanto reclama que ocupa o Ministério dos Transportes – ao qual a autarquia é ligada -, mas não tem grande influência ali dentro.

Nesse processo, sobressaem as bancadas de Goiás (R$ 676,2 milhões), Roraima (R$ 202,3 milhões) e Mato Grosso do Sul (R$ 330 milhões). Das comissões, prevalece a de Infraestrutura do Senado (R$ 271,1 milhões) e Viação e Transportes da Câmara (R$ 31,1 milhões). Só o relator-geral empenhou R$ 5,1 bilhões. O pouco que resta é ocupado por parlamentares do Mato Grosso. Wellington Fagundes (PR), Homero Pereira (PSD) e Blairo Maggi (PR) foram os únicos a empenhar em 2012: R$ 9,1 milhões cada um. Minas e Energia também é outra que só trabalha com emendas para o relator-geral, o que afasta a apresentação de emendas individuais dos parlamentares.

Integração Regional é uma das Pastas que mais trabalham com emendas. Mas prefere distribuí-las para bancadas regionais (Alagoas, Ceará, Paraíba e Pernambuco, preferencialmente), comissões e relator-geral. Esses ficam com cerca de um terço das emendas. O que sobra é repartido individualmente entre parlamentares do PMDB e do PSB, que a ocupam desde que foi criada, em 2003.

Alguns órgãos ligados à Pasta também têm bom desempenho, como o Departamento Nacional de Obras contra as Secas (Dnocs). Era de se esperar, já que ele é controlado por um indicado de Henrique Alves, o patrocinador da PEC do Orçamento impositivo. Mas é o Ceará, onde fica sua sede, que domina as emendas. Deputados como Domingos Neto (PSB), Genecias Noronha (PMDB), Mauro Benevides (PMDB), José Airton (PT), José Linhares (PP) e Gorete Pereira (PSB) transitam bem por ali.

Já a Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba (Codevasf), cujo diretor é indicado pelo governador da Bahia, Jaques Wagner (PT), é controlado no quesito emendas pela Bahia e Piauí. Dez baianos conseguiram empenho em 2012 na soma de R$ 13 milhões. Mas os recordistas são do Piauí: Ciro Nogueira, Osmar Júnior (PCdoB) e Hugo Napoleão (PSD) e Jesus Rodrigues (PT) conseguiram cada um R$ 17,3 milhões. Por outro lado, Sudeco, Sudam e Sudene, também ligados à Integração, têm desempenho pífio nas liberações.

Turismo, uma das preferidas dos parlamentares, tem presença forte de PT e PMDB, o último e atual ocupante da Pasta. Apesar disso, todos os partidos são bem atendidos e destinam muitas emendas para esse setor. Chama a atenção, todavia, ser aí o filão dos caciques do PMDB. O atual vice-presidente da República, ex-deputado e presidente nacional do PMDB, Michel Temer, continua recebendo emendas antigas de seu tempo de Câmara. Em 2012 foi o recordista, com R$ 10,7 milhões, seguido por Renan Calheiros (R$ 9,8 milhões), Romero Jucá (R$ 7,7 milhões) e Valdir Raupp (R$ 6,1 milhões). Controlada pelo PDT desde 2007, Trabalho é um reduto do partido. O ex-ministro Brizola Neto detém o recorde deste governo: conseguiu empenhar R$ 6 milhões.

Até a oposição conseguiu meios para sobreviver. Desenvolvimento Social, que abriga o programa da era Lula, o Bolsa Família, tem dentre os mais bem posicionados oposicionistas ou ex-oposicionistas: Otávio Leite (PSDB-RJ), Eduardo Barbosa (PSDB-MG), Paulo Bauer (PSDB-SC), Kátia Abreu (PSD-TO) e Guilherme Campos (PSD-SP) foram alvo de bons empenhos em 2012. Na Justiça ocorre algo semelhante. No mesmo ano, destacam-se Eduardo Gomes (PSDB-TO), João Campos (PSDB-TO), Luiz Fernando Machado (PSDB-SP) e Romero Rodrigues (PSDB-PB).