Brasil deve rever estrutura de tarifas, mas ainda precisa de política industrial
Autor(es): Por Marta Watanabe | De São Paulo
Nos últimos dez anos, a indústria perdeu quase sete pontos percentuais de participação no Produto Interno Bruto (PIB). Ao longo dessa década, cresceram as pressões do empresários e de parte da academia por medidas de política industrial para devolver a competitividade do setor. O novo patamar de câmbio, defenderam economistas reunidos ontem pela Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), não altera essa necessidade. Pelo contrário. O câmbio atual, dizem, cria novas oportunidades e prioridades.
David Kupfer, professor de economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e assessor da presidência do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), diz que a percepção da necessidade da política industrial está se tornando consensual. Para ele, isso reflete um cenário internacional que vem reforçando o papel do setor na economia.
Ele lembra, porém, que é preciso primeiro “arrumar a casa”, o que passa pelo câmbio e pela questão fiscal. Em termos mais concretos ele diz que a questão tarifária, bastante “distorcida”, é a bola da vez. Segundo ele, o Brasil pode “ganhar espaço se arrumar a estrutura tarifária e a estrutura de proteção da indústria. O nível de proteção do setor automobilístico é de cerca de 200% e a de eletrodomésticos é de 170%. E há segmentos com proteção negativa”, diz ele. O melhor caminho, segundo diferentes economistas presentes ao debate, é proteger mais os insumos e liberar mais os produtos de alto valor agregado.
José Roberto Mendonça de Barros, sócio da MB Associados, diz que a desvalorização recoloca a urgente necessidade de revisão cuidadosa da estrutura tarifária. “O sistema foi objeto de muita intervenção localizada, e perdeu a racionalidade no geral.”
Kupfer também acredita que determinados resultados e desempenhos ligados à indústria precisam ser repensados. “Precisamos de inovação, competitividade e produtividade, mas estamos ainda aprisionados no imperativo desses fatores no modelo do século XX. É preciso acompanhar as grandes transformações para esses três resultados.” A inovação, diz ele, não está somente no chão de fábrica, mas também na pré-produção e pós-produção, que em geral são serviços. Interessa à manufatura comandar serviços pré e pós venda. Mariano Laplane, presidente do Centro de Gestão e Estudos Estratégicos (CGEE), ligado ao Ministério de Ciência e Tecnologia, reconhece que as medidas atuais de política industrial – que combinam incentivo a conteúdo local e estímulo à inovação, entre outros – não são mais suficientes. Esses instrumentos, diz, foram lançados para reparar os efeitos da crise externa e precisam de revisão.
Mansueto Almeida, pesquisador do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), diz que o Brasil deve repensar a destinação do orçamento e estrutura de gastos públicos. “Desde 1999 a despesa do setor público não financeiro aumentou 3,5 pontos percentuais do PIB, prioritariamente com gastos com previdência, assistência social e programas sociais como Bolsa Família.” Ele pondera que a destinação de orçamento é uma decisão política, mas hoje a indústria demanda que o governo faça parte do processo de retomada do setor.