Governo já desistiu da meta fiscal de 1,9% do PIB no ano

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Falta apenas anunciar. Há indícios fortes de que o governo já decidiu não cumprir a meta de superávit primário para todo o setor público de 1,9% do Produto Interno Bruto (PIB) neste ano, mas espera o momento mais adequado para anunciar a decisão. É provável que isso aconteça até o dia 22 de setembro, quando o governo terá que encaminhar ao Congresso o relatório de avaliação de receitas de despesas do quarto bimestre. Ele terá que dizer com qual previsão de crescimento da economia em 2014 trabalha e ajustar as trajetórias de receitas e despesas. Seria o momento certo para anunciar a redução da meta fiscal.

Resultados fiscais – Quando se analisa os resultados fiscais do governo central (Tesouro, Previdência e Banco Central) em maio, em junho e em julho, que foram de déficits primários elevados – os maiores da série histórica para os respectivos meses -, é razoável acreditar que a decisão de não alcançar o superávit foi tomada há muito tempo.

Déficits – Nunca havia ocorrido três déficits primários seguidos desde o início da série histórica do Banco Central, em dezembro de 2001. Ao avaliar o comportamento da economia no início deste ano, o governo pode ter concluído que o desaquecimento estava muito forte e, seguindo a sua orientação de que a política fiscal deve ser anticíclica, decidiu afrouxar os poucos controles que ainda mantinha sobre o gasto.

Receitas – De janeiro a julho, as receitas do Tesouro (não inclui Previdência) cresceram 2,1% menos que o PIB e, mesmo assim, os gastos do Tesouro subiram 4,2% acima da expansão da economia. Ou seja, mesmo com a receita minguando, o governo manteve forte expansão de suas despesas, que aumentaram em proporção do PIB.

Redução do superávit – Para sustentar essa política fiscal expansionista, a área econômica teve que reduzir substancialmente o superávit primário do governo central que, nos sete primeiros meses deste ano, ficou em apenas R$ 13,5 bilhões ou 0,46% do PIB, segundo o Banco Central. É o menor superávit do governo central para o período desde o início da série histórica. Nem mesmo em 2009, quando o país viveu uma recessão econômica, o resultado foi tão ruim.

Meta – A meta de superávit do governo central para este ano é de R$ 80,8 bilhões, algo como 1,55% do PIB. Isto significa que para alcançar a meta o governo terá que obter uma economia de mais R$ 67,3 bilhões (R$ 80,8 bilhões menos R$ 13,5 bilhões) de agosto a dezembro – o que daria R$ 13,5 bilhões por mês. Ou seja, teria que obter em cada mês o mesmo superávit que registrou de janeiro a julho. “A meta do ano, com esses déficits nos últimos três meses, ficou mais distante e exigirá um esforço maior do governo nos últimos cinco meses do ano”, disse, na sexta-feira, o chefe do Departamento Econômico do Banco Central, Túlio Maciel. “O primário não está aquilo que se deseja”, admitiu o secretário do Tesouro, Arno Augustin.

Possibilidade – Nenhum consultor do mercado acredita que seja possível alcançar a meta fiscal, muito menos os economistas que trabalham para o governo, mesmo com as receitas extraordinárias que ingressarão nos cofres do Tesouro por conta do Refis – o parcelamento de débitos tributários com vantagens e descontos de juros e multas – e do leilão do sistema 4G de telefonia celular. Se haverá receitas extras, também haverá gastos que foram represados ou adiados ao longo deste ano e que o governo terá que pagar, como os R$ 5,5 bilhões em precatórios aos aposentados e pensionistas do INSS e aos servidores públicos, que irão impactar o caixa do Tesouro em outubro e novembro. Nem a metade das despesas com a Conta de Desenvolvimento Energético (CDE) foi paga até o fim de julho.

Cortes adicionais – Para obter a meta de superávit primário, o governo certamente teria que fazer cortes adicionais nos gastos, o que não parece factível, pois há uma questão ideológica envolvida nesta questão. Seria uma grande contradição, em plena campanha eleitoral, o governo adotar uma política fiscal contracionista para obter um superávit primário de R$ 67,3 bilhões em cinco meses, no momento em que a economia brasileira está em recessão.