Controle de despesa foi bem-sucedido em outros países

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A experiência internacional mostra que países que adotaram regras fiscais baseadas no comportamento da despesa do setor público tiveram resultados positivos, como melhora do balanço orçamentário, controle efetivo do gasto e maior capacidade de realizar políticas fiscais anticíclicas. Por se tratar de um item sobre o qual o governo tem poder direto, limites para o gasto também costumam ter melhores índices de cumprimento do que regras para a dívida, por exemplo, especialmente se estiverem estabelecidas em lei. Ao mesmo tempo, limites para expansão da despesa costumam estar associados a redução do nível de investimento em economias emergentes e persistem preocupações com a composição do gasto, já que projetos produtivos, mas de baixo apelo eleitoral, podem acabar não sendo priorizados. As conclusões são de um levantamento do Fundo Monetário Internacional (FMI) conduzido no ano passado, que analisou regras para a despesa adotadas por 29 países entre 1985 e 2013. Os autores, porém, alertam que a amostra é pequena para permitir resultados conclusivos. Em 10 dos países analisados, a regra foi abandonada, seja pela falta de cumprimento, seja porque a consolidação fiscal teve sucesso e o governo decidiu não mais limitar o crescimento do gasto. A regra brasileira, porém, tem algumas “jabuticabas” que a distancia de outras experiências, na avaliação de José Roberto Afonso, professor do Instituto de Direito Público (IDP), e dos especialistas em contas públicas Felipe Salto e Leonardo Ribeiro. Os três analisaram como funcionam os limites de crescimento real da despesa em 14 países, com base em outro levantamento do FMI que listou regras fiscais adotadas em 88 países. O estudo, obtido com exclusividade pelo Valor, será publicado na próxima edição da revista de Conjuntura Econômica da FGV. Ribeiro, que é analista do Senado Federal, afirma que a proposta apresentada pelo governo, aprovada em 1º turno pela Câmara no início da semana, é interessante, mas tem algumas particularidades em relação ao que costuma ser adotado no restante do mundo. Por enquanto, afirma, apenas 14 dos 88 países analisados pelo FMI no “Fiscal Rules at a Glance” têm uma regra que limita o crescimento real da despesa. Em 40 países, há outros tipos de limite para o gasto, como a regra que estabelece um teto para a despesa com pessoal no Brasil, por exemplo. O mais comum são regras para o resultado fiscal ou para a dívida, sendo que em vários países se adota mais de um parâmetro de controle. Segundo Ribeiro, o que mais diferencia a PEC 241 dos limites para a despesa adotados em outros países é o prazo de duração, de 20 anos, com possibilidade de revisão apenas do método de correção da despesa em dez anos. “Mesmo que se mude o índice de correção, as exceções para a PEC serão as mesmas”, afirma o especialista em contas públicas. Para ele, um prazo menor, de sete anos, por exemplo, seria mais interessante. O mais comum, como acontece na Finlândia, na França e na Holanda, é que a regra seja revista a cada quatro anos, diz ele. Outro problema da PEC é que ela não considera o momento do ciclo econômico. “A regra não leva em consideração que estamos em um estágio ruim do ciclo e quando o país voltar a crescer, podemos ter um superávit primário muito elevado, para o qual a PEC não dá destinação certa”, diz. Em outros países, o teto considera a evolução do PIB potencial. Na Austrália, por exemplo, a regra limitou o crescimento da despesa, em termos reais, a 2%, até que a economia volte a crescer em linha com o potencial e o superávit primário seja de 1% do Produto Interno Bruto (PIB). O Peru ainda adota uma válvula de escape para períodos de baixo crescimento ou em caso de emergência, lembra Ribeiro. Por último, afirma, o Novo Regime Fiscal exige reformas estruturais do gasto, como a Previdência, para funcionar. Se esse tipo de medida for aprovada pelo Congresso, é provável que em seis ou sete anos a regra volte a ser revisada. A regra mais parecida com a brasileira, que congelou o gasto em termos reais, aconteceu na Bélgica e durou seis anos, de 1993 a 1998, destaca Ribeiro. O especialista em finanças públicas Guilherme Tinoco também considera o prazo muito longo, embora pondere que possa fazer parte da estratégia de negociação do governo. Para ele, é possível que a regra seja revista em menos de dez anos, até porque por volta desse período o país terá superávits primários superiores ao necessário para controlar o déficit público, o que deve aumentar a demanda por gastos, especialmente na área social. Nos cenários traçados pelo economista no estudo “Regras Fiscais no Brasil: uma análise da PEC 241”, o resultado primário em 2027 já seria superior a 2%, podendo chegar a 4% em 2032. Sem a aprovação da reforma, porém, o país tende a ter um déficit de 1% do PIB indefinidamente. Tinoco reforça que a reforma da Previdência é chave para que o teto funcione. A desvinculação dos benefícios de assistência social do salário mínimo também dariam mais espaço para o manejo das demais despesas do orçamento, em sua avaliação. “Assim, tal medida mostra­se importante para dar credibilidade e ajudar a cumprir efetivamente a regra proposta pela PEC”, afirma. Para Tinoco, a regra brasileira parece estar em linha com as melhores práticas observadas no cenário internacional, já que a meta é bem definida e adequada ao objetivo de corrigir desequilíbrios nas contas públicas. No estudo, no qual ele utilizou o levantamento do FMI com 29 países que também têm regras para o aumento do gasto, ele ressalta que a PEC permite “que o ajuste fiscal seja implementado ao longo do tempo, impedindo um ajuste muito forte no curto prazo”. Ele também avalia que o piso para gastos com saúde e educação, que funcionariam como uma “proteção” para essas despesas, podem mitigar os principais efeitos colaterais relatados nas experiências internacionais. Como a mudança propõe alteração na Constituição, ele avalia que o cumprimento do teto tende a ser até mais estrito do que em outros países. “O fato [das regras] serem simples e transparentes também fazem com que o fácil monitoramento pela sociedade seja uma fonte de ‘enforcement'”, diz ele. Em sua avaliação, a regra anterior, de metas para o resultado primário, não obteve os resultados desejados porque tem o “conhecido problema” de tornar a política fiscal mais pró­cíclica, além de estimular a busca por receitas nãorecorrentes e até truques contábeis.