Contas públicas ruins reforçam o pessimismo
O Tesouro Nacional e o Banco Central divulgaram, na semana passada, um conjunto de dados nada animador sobre as contas públicas. No primeiro semestre deste ano, todos os indicadores fiscais pioraram. O déficit nominal – o melhor conceito para ser utilizado, pois inclui o custo das dívidas dos governos para a população – atingiu 3,61% do Produto Interno Bruto (PIB) nos seis primeiros meses de 2014. No mesmo período do ano passado, estava em 2,82% do PIB. O superávit primário foi o menor para o primeiro semestre de um ano desde 1998, antes, portanto, do Brasil fazer o seu acordo com o Fundo Monetário Internacional (FMI) e iniciar um programa de ajuste fiscal.
De janeiro a junho, o governo federal só conseguiu economizar R$ 15,4 bilhões para pagar os juros de suas dívidas, segundo o Banco Central. Em relação ao PIB, é o menor superávit primário para o primeiro semestre de um ano desde 1998. A meta do governo central (Tesouro, Previdência e Banco Central) para este ano é de R$ 80,8 bilhões. Assim, até junho, só 19,1% da meta foi obtida. O desafio é conseguir economizar mais R$ 65,4 bilhões no segundo semestre, o que dá uma média de R$ 10,9 bilhões de superávit primário por mês.
Quando se olha o resultado do Tesouro Nacional no primeiro semestre, o que mais chama a atenção é que a receita está crescendo abaixo da expansão do PIB e a despesa (não inclui os benefícios previdenciários), por sua vez, está aumentando em ritmo acelerado, de 5,1% acima do crescimento do PIB, segundo estima a própria Secretaria do Tesouro. O governo gastou R$ 34,2 bilhões a mais no primeiro semestre deste ano na comparação com igual período de 2013. Ao abrir os dados, é possível verificar que os gastos de custeio e investimento apresentaram uma expansão de 17,9% na comparação com os primeiros seis meses do ano passado. Nesse conceito de custeio da máquina não está incluída a despesa com o pagamento dos servidores, que foi a que menos aumentou.
Não se pode, portanto, atribuir o desidratado superávit primário do primeiro semestre deste ano apenas ao comportamento da receita, que ficou abaixo das expectativas iniciais, por causa do fraco crescimento econômico e das desonerações tributárias. O fato, que os números divulgados pelo Tesouro e pelo Banco Central mostram com clareza, é que o governo não fez o menor esforço para controlar os seus gastos no período.
No primeiro semestre, a dívida líquida do setor público em relação ao PIB e a dívida bruta apresentaram elevações significativas. A dívida líquida passou de 33,6% do PIB em dezembro de 2013 para 34,9% em junho deste ano e a bruta, de 56,7% do PIB para 58,5% do PIB. Essa piora reflete o impacto da elevação da taxa de juros, promovida pelo Banco Central, e o fato da economia estar crescendo em ritmo muito fraco, abaixo do seu potencial. Mas indica também, com clareza, que o superávit primário que está sendo produzido pelo setor público não é suficiente para manter as dívidas estáveis em relação ao PIB ou em trajetória de queda.
Vale ressaltar que a trajetória da dívida pública é condicionada à taxa de juros de equilíbrio e à capacidade de crescimento da economia do país no longo prazo. Mas o desempenho das contas fiscais nos últimos meses alimenta o pessimismo que toma conta do mercado e que foi tão criticado nos últimos dias pela presidente Dilma Rousseff. A preocupação é maior porque a meta fiscal deste ano só será alcançada se o governo conseguir obter uma elevada receita extraordinária, que é aquela que não consta do fluxo normal da arrecadação, pois resulta de ações do Poder Público na Justiça contra devedores ou de parcelamentos especiais das dívidas tributárias.
Neste ano, o governo espera obter cerca de R$ 27 bilhões em receitas extraordinárias, sendo R$ 18 bilhões apenas com a reabertura do Refis. É um montante semelhante ao registrado em 2013, que foi um recorde histórico. Como as despesas públicas criadas no Brasil costumam ser permanentes, a questão que se coloca é se no próximo ano o governo terá novamente receitas extraordinárias suficientes para fechar suas contas e cumprir a meta fiscal. A dificuldade de alcançar o superávit primário deste ano indica que, em 2015, o presidente eleito, qualquer que seja ele, terá que fazer um ajuste fiscal.