Abismo fiscal, discurso oportunista

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Autor(es): Carlos José Marques

Nessa avalanche de ataques e críticas contra as contas públicas sobram exageros e desconsideram-se os fatos. Da noite para o dia, o mercado tratou de apostar que o Brasil chegou à beira de um abismo fiscal, com todo aquele coquetel de efeitos típicos de um país quebrado: calote, desvios na política econômica, maquiagens de índices e por aí afora. Algo que não bate com a realidade em vigor. O alarmismo em final de ano e às vésperas de uma eleição presidencial é tão previsível como o peru de Natal. Por decisão deliberada, o governo havia adotado, desde o início de 2013, medidas de desoneração de impostos em combinação com o aumento de despesas para destravar projetos do PAC e engordar as linhas de financiamento do BNDES, como forma de incentivo à iniciativa privada.

Tentava assim dar novo fôlego e vigor à economia, que havia patinado e entregue um “pibinho” em 2012. As duas frentes de ação provocaram, naturalmente, maiores gastos e menor arrecadação, dentro de uma margem de segurança que levou as autoridades monetárias a estabelecer um novo piso de superávit primário, da ordem de 2,3% – menor que o do exercício anterior, mas ainda assim louvável em comparação com o que é registrado em outras praças mundo afora. O aperto (ou ameaça) que pode desembocar em um eventual não cumprimento dessa meta fiscal está menos ligado a erros estratégicos da equipe econômica. Pode e deve ser atribuído ao volume de penduricalhos e projetos eleitoreiros em tramitação no Congresso que vão onerar os cofres da União em mais de R$ 60 bilhões.

Ou seja: seriam as mesmas alas partidárias que tratam de espalhar a boataria de quebradeira iminente as responsáveis pelo festival de abusos orçamentários. Uma emenda constitucional, prestes a ser aprovada na casa parlamentar, deixa as autoridades federais praticamente de mãos atadas para barrar os excessos. O chamado Orçamento Impositivo obriga o Tesouro a liberar despesas para cobrir toda e qualquer proposta de autoria de deputados e senadores. Um descalabro! Até aqui, essas liberações cabiam ao Executivo – que é, afinal, em última instância, o maior responsável por cumprir o superávit preestabelecido. Sem essa prerrogativa, as chances da baderna fiscal ficam a cargo dos oportunistas políticos de plantão.