Governo cai no “cheque especial”

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Autor(es): DECO BANCILLON

Sem conseguir aumentar a arrecadação e diante de gastos cada vez maiores da máquina estatal, o governo passou a recorrer como nunca a uma espécie de cheque especial. A conta pode ser medida pela piora da situação fiscal do país. Durante os dois mandatos de Lula, o deficit nominal (receitas menos despesas) médio foi de R$ 80,4 bilhões, no acumulado em 12 meses. Já sob o comando de Dilma Rousseff, essa conta engordou em 37,1%, saltando para R$ 110,3 bilhões.

A situação vem piorando a cada nova divulgação feita pelo governo. Em setembro, chegou ao pior patamar da história. Naquele mês, de acordo com dados do Banco Central (BC), o deficit nominal alcançou incríveis R$ 155,4 bilhões. Como essa despesa é paga por toda a sociedade, é possível dizer que os gastos do governo “roubaram” o equivalente 3,3% do Produto Interno Bruto (PIB) no período.

A conta é paga por toda a sociedade na forma de gastos cada vez maiores com juros da dívida pública. Em dezembro 2010, no acumulado em 12 meses, a despesa financeira do setor público era de R$ 195,3 bilhões, o que correspondia a 5,18% do PIB. Em setembro passado, o gasto chegou a R$ 229,6 bilhões. Como as riquezas do país aumentaram desde então, a proporção dos juros sobre o PIB diminuiu para 4,91%.

A fatura cresce à medida que os resultados da política fiscal se distanciam das metas. Neste ano, a promessa é economizar o equivalente a 2,3% do PIB para pagar os juros da dívida — o chamado superavit primado. No entanto, até setembro, o resultado ficou em 1,58%, o que leva o mercado financeiro a duvidar da capacidade da equipe econômica de cumprir o previsto em lei. “O dado foi tenebroso. Tornou-se impossível atingir a meta”, disse o economista-chefe da Gradual Investimentos, André Perfeito.

Pressão
O governo atribui o mau resultado de setembro a um “ponto fora da curva”. Para uma fonte da equipe econômica, o deficit primário de R$ 9 bilhões, o pior resultado já registrado para o mês, não mostra uma “tendência de piora” das contas públicas e, nos próximos meses, haverá uma melhora considerável na política fiscal. Para esse interlocutor, o mercado faz análises “catastrofistas”.

Segundo analistas, os gastos do governo, que crescem sistematicamente acima das receitas desde junho de 2012, estão provocando inflação e, para reduzir a pressão sobre os preços, o BC terá de aumentar ainda mais os juros básicos da economia, hoje em 9,5% ao ano. “Acredito que a Selic vai subir para 10% no fim do mês, e deverá continuar subindo até fevereiro, até chegar a 11% ao ano”, projetou Perfeito.

Luciano Rostagno, estrategista-chefe para o Brasil do Banco japonês Mizuho, disse que o BC não precisaria pesar tanto a mão sobre os juros se o governo fizesse a sua parte e reduzisse os gastos públicos. “A política fiscal atua na contramão da política monetária. Enquanto o BC sobe juros, o governo gasta mais. Nessa situação, o mercado aproveita para cobrar prêmios maiores do Tesouro porque sabe que a inflação já voltou a subir”, disse. A projeção dos analistas ouvidos pelo BC na pesquisa Focus é de que o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) acumule alta de 5,85%em 2013. Até semana passada, a estimativa era de 5,83%.

Preocupado, o governo se empenha em evitar que o Congresso aprove medidas com impacto no orçamento. Ontem, todos os líderes na Câmara almoçaram com o ministro da Fazenda, Guido Mantega. À noite, em reunião com líderes da base aliada, a ministra da Secretaria de Relações Institucionais, Ideli Salvatti, fez um apelo para que fosse mantida a responsabilidade fiscal. Ela frisou que não há condições de ampliar a despesa sem receita. “Isso serve para as pessoas, para as famílias e, mais do nunca, serve para os governos”, resumiu a ministra.