A corrosão das contas públicas

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Corroídas pela gastança federal, pelos erros do governo e pela consequente estagnação da economia, as contas públicas nacionais continuam mal e sem perspectiva de grande melhora nos próximos meses. O resultado primário do primeiro semestre – R$ 52,16 bilhões ou 2,25% do PIB – foi o pior para o período de janeiro a junho desde 2010. Nos primeiros seis meses do ano passado havia correspondido a 3,08% do PIB. O acumulado em 12 meses, de R$ 91,5 bilhões, correspondeu a 2% do PIB. A meta revista para este ano é de 2,3%. A presidente Dilma Rousseff e o ministro da Fazenda, Guido Mantega, desistiam há meses da meta fixada originalmente na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), de 3,1%. Se esse objetivo for alcançado, será com auxílio de receitas extraordinárias, como dividendos antecipados de empresas estatais e o bônus previsto para a licitação, em outubro, de uma grande área do pré-sal O superávit primário é o dinheiro posto de lado para o serviço da dívida pública – na prática, apenas para pagar uma parte dos juros vencidos. Gomo esse dinheiro é insuficiente para equilibrar as contas, é geralmente negativo o resultado nominal, isto é, as despesas totais são normalmente maiores que as receitas. Esse déficit equivaleu a 2,07% do PIB nos primeiros seis meses de 2011, a 2,13% no semestre inicial de 2012 e a 2,85% no acumulado de janeiro a junho deste ano. Segundo o governo federal, a política frouxa é necessária para estimular a atividade econômica, mas o resultado tem sido abaixo de pífio. Se o crescimento do PIB em 2013 for o triplo do obtido no ano passado, será igual ao de 2011, de 2,7%.

Por enquanto, esse resultado está acima das projeções de mercado. A mediana das previsões, no último fim de semana, era de 2,28%, segundo a pesquisa Focus, realizada semanalmente pelo Banco Central (BC). Para 2014 a expansão estimada é de 2,6%. A consulta é realizada com cerca de uma centena de instituições financeiras e consultorias independentes.

De maio para junho o superávit primário mensal subiu de 1,95% para 2% do PIB, O resultado de junho, de R$ 5,43 bilhões, ficou acima da projeção mais alta dos especialistas do setor financeiro, de R$ 4,7 bilhões. Mas a maior parte da melhora se deveu à elevação do superávit dos governos estaduais, de 0,43% para 0,5% do PIB. O superávit obtido nos Estados, de R$ 3,4 bilhões, foi o maior da série registrada pelo BG a partir de 1998.

A piora das contas públicas é explicável principalmente pela má gestão das finanças federais. O governo da União tem mais liberdade que Estados e municípios para decidir a gestão dos tributos, a concessão de subsídios e a elevação dos gastos. O uso dessa liberdade tem sido claramente nocivo.

Além disso, a gestão imprudente das contas públicas tem sido um importante fator inflacionário. A inflação brasileira tem sido maior que a de países latino-americanos mais dinâmicos.

No primeiro semestre, o superávit primário do governo central ficou em R$ 34,4 bilhões e foi 28,3% menor que o de igual período de 2012, segundo o Tesouro. Esse resultado é diferente daquele indicado nos cálculos do BG, por uma questão de método, mas a tendência apontada é a mesma e, além disso, as contas publicadas pelo Tesouro permitem uma visão mais detalhada das finanças federais.

Segundo esse relatório, a arrecadação total, de R$ 560,87 bilhões, foi 7,5% maior que a de um ano antes, enquanto a despesa, de R$ 428,41 bilhões, ficou 12,9% acima da contabilizada no primeiro semestre do ano anterior. O resultado de junho, um superávit primário de R$ 1,27 bilhão, só foi possível com o ingresso de R$ 5,16 bilhões de receitas extraordinárias, isto é, de dividendos e concessões.

Dividendos, especialmente antecipados, e receitas de concessões são ganhos eventuais, muito menos previsíveis e seguros que a arrecadação tributária. Têm. sido usados, no entanto, para reforçar um orçamento com despesas permanentes cada vez maiores. Um governo prudente e preocupado com a credibilidade. Cada vez menor, no caso brasileiro – evitaria esse jogo arriscado.