Apesar do corte, ajuste é duvidoso
Autor(es): Por Leandra Peres, Edna Simão e Thiago Resende | De Brasília
O corte adicional de R$ 10 bilhões nas despesas do governo federal, anunciado pelos ministros da Fazenda, Guido Mantega, e do Planejamento, Miriam Belchior, não garante o cumprimento da meta de superávit primário do setor público de 2,3% do PIB neste ano. Com as medidas, o superávit seria elevado em 0,2% do PIB, dos atuais 1,3% para 1,5%. Para chegar aos 2,3%, Estados, municípios e suas estatais teriam de fazer uma economia de 0,8% do PIB, o que é considerado muito difícil por especialistas.
Há outras questões que levantam dúvidas sobre a consistência do corte. A redução de R$ 4,4 bilhões nos gastos com a compensação de desonerações da folha de pagamentos à Previdência, por exemplo, é neutra do ponto de vista fiscal. O Tesouro deixará de pagar, mas a receita da Previdência cairá em valor correspondente. Ou seja, o corte é compensado pela receita menor que não entra no cofre do INSS. Portanto, ele não pode ser apresentado como ajuste adicional para alcançar a meta de superávit.
O governo recuou da decisão de usar até R$ 15 bilhões em recebíveis de Itaipu para cobrir as despesas da geração de energia pelas termelétricas e da redução nas tarifas residenciais anunciada pela presidente Dilma Rousseff em cadeia nacional de TV no começo do ano.
A operação, considerada uma “contabilidade criativa”, passará a ser contabilizada como uma despesa primária do Tesouro Nacional. Mantega explicou que o governo “está abrindo mão” da antecipação dos recebíveis, porque “alguns questionaram” a operação.
O governo havia editado uma medida provisória que permitia ao Tesouro Nacional emitir dívida para antecipar o fluxo de recebimento dos recebíveis e assim financiar as despesas da Conta de Desenvolvimento Energético (CDE). Segundo Mantega, a partir de agora os recebíveis voltam a ser uma receita primária do Tesouro e seguirão o fluxo normal de recebimento, cerca de R$ 4 bilhões por ano.
Mais da metade do corte anunciado – de R$ 10 bilhões – será baseado na reestimativa de receitas – R$ 5,6 bilhões. Outros R$ 4,4 bilhões serão obtidos com a redução de gastos com passagens aéreas, compra de carros e serviços de limpeza. “A política fiscal é neutra” disse Mantega, que vem sendo criticado, inclusive pelo Banco Central (BC), por gastos expansionistas que aumentam a pressão inflacionária. “O governo está determinado a fazer o melhor resultado fiscal possível”, afirmou.
A disputa em torno do tamanho do corte opôs o Ministério da Fazenda ao Planejamento e à Casa Civil, que defendiam não haver cortes, ou que o ajuste fosse menor. Mantega reconheceu que havia posições diversas e explicou que os R$ 10 bilhões foram “consenso”. Fazenda e Planejamento explicaram que revisão de sentenças judiciais e adiamento na contratação de novos servidores permitiram economia de R$ 2,5 bilhões em relação ao que havia sido projetado em maio, quando o governo fez um corte de R$ 28 bilhões.
O Tesouro também ajustou sua compensação ao INSS pela desoneração na folha de pagamentos. De acordo com a ministra do Planejamento, Miriam Belchior, esses repasses serão feitos a cada quatro meses. Dessa forma, parte da projeção de gastos feita no início do ano não terá impacto em 2013 e só sairá do caixa no ano que vem. “Não é empurrar com a barriga. É um ajuste mesmo”, disse a ministra, para quem o corte “não está jogando as despesas para frente”.
O ajuste no gasto de 2013 vem sendo apontado por analistas do mercado financeiro e investidores como essencial para recuperar a confiança na política econômica, abalada também por manobras contábeis, que aumentaram artificialmente a receita do Tesouro.
Segundo Mantega, a confiança é um conceito “relativo”. Jocosamente, citou análises, segundo as quais o nascimento do bebê real no Reino Unido aumentará a confiança econômica naquele país. “A confiança estará voltando em breve”, disse o ministro, apontando as concessões de infraestrutura programadas para o segundo semestre e a recente redução na inflação como motivos para esse movimento.
O governo também reviu seus principais parâmetros macroeconômicos: o Produto Interno Bruto (PIB) crescerá menos e a inflação será maior. O crescimento foi reduzido de 3,5% para 3% e a expectativa para o IPCA subiu de 5,2% para 5,7% em 2013.
O resultado dessa revisão foi uma queda de R$ 4,7 bilhões na arrecadação da Receita Federal e outros R$ 3 bilhões nas receitas da Previdência Social. O Tesouro Nacional também espera receber um pouco menos em dividendos que o programado em maio. Em vez dos R$ 24 bilhões, estima agora em R$ 22 bilhões as transferências de lucros das estatais.
A receita esperada com as concessões foi elevada em R$ 7,4 bilhões. De acordo com a ministra do Planejamento, a definição da outorga do campo de Libra, da área do pré-sal, em R$ 15 bilhões foi o principal motivo para esse ganho nas receitas. No total, a União espera arrecadar R$ 23,1 bilhões com as concessões.
O novo decreto de contingenciamento, por outro lado, não mexeu nas emendas parlamentares, investimentos ou despesas com saúde e educação.