Um ano de desafios pela frente

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A democracia brasileira tem características próprias e interessantes. Pode-se discutir até que ponto o início do assunto eleitoral a mais de um ano da eleição contribui negativamente para o exercício do governo presente. Mas não adianta. Na prática, já estamos em processo eleitoral e sob esta realidade que temos que lidar com problemas que deveriam estar em outro contexto.

Agora mesmo, por iniciativa do Congresso Nacional, discute-se uma reforma do serviço público, que terá capacidade para alterar profundamente a estrutura do Estado e sua capacidade de prestar os serviços que a lei lhe comanda. É o Legislativo, já todo em modo eleição, operando mudanças no Executivo, cujo interesse eleitoral também dá as caras na arena pública.

O Brasil deveria discutir formas de separar melhor o que é o exercício do poder daquilo que é a disputa pelo poder. Mas infelizmente isso não acontece, e assim os servidores públicos de todas as esferas estão metidos em um jogo de interesses políticos com consequências imprevisíveis. Não chega a ser uma situação nova, mas definitivamente não é o ideal.

Como nós que somos servidores de carreira, e nossas associações sindicais, podemos e devemos nos posicionar diante de situações como esta, em que de repente nossas funções e capacidades para cumpri-las podem ser afetadas, muitas vezes sem sequer opinarmos?

Acreditamos que em um contexto democrático, que nos interessa manter e aprofundar, a saída é pela participação. Exigir, cobrar e se posicionar diante de políticos eleitos é uma obrigação de todo cidadão, mas em especial daqueles que têm representatividade sindical de carreiras de Estado. Ou seja, no nosso caso, o contexto demanda uma posição ainda mais imponente.

Esta posição deve ser a de deixar claro o que aceitamos e o que não aceitamos, explicar por que não aceitamos e sempre lembrar a classe política de que seus mandatos são uma propriedade do povo brasileiro. É a nós que eles devem responder, não o inverso.

Isto é o que nos cabe fazer com relação ao exercício do poder. Porém, e quando se trata das disputas eleitorais, nas quais os jogos de interesse são muito mais ocultos e isolados da atenção dos eleitores? Nem, neste caso, só nos resta apostar conforme os currículos, e ter a coragem de se posicionar diante daquilo que as evidências empíricas nos apresentam.

É preciso deixar bem estabelecido: não devemos apoiar quem trabalha contra a estrutura e as capacidades do Estado; não devemos votar naqueles que estiveram a favor de cortes exagerados no orçamento público e desconsideram necessidades legítimas da população; não devemos referendar políticos cujas artimanhas e negociações colocam interesses particularistas em primeiro lugar, em detrimento do interesse público e do atendimento dos direitos estabelecidos na Constituição.

O voto é inviolável e cada um tem sua consciência. Mas nunca é demais alertar que, se hoje enfrentamos seríssimas dificuldades com a classe política brasileira, isso se deve a um processo de intensa despolitização, ocorrido ao longo dos últimos anos. Nada nunca esteve garantido, embora muitos de nós tenhamos acreditado nisso. Tal como Sísifo, nosso destino é rolar a pedra morro acima, mesmo que ela caia vez atrás de vez.