
Com a aproximação das anunciadas tarifas de 50% sobre a exportação de produtos brasileiros para os Estados Unidos, muitos discutem hipóteses ainda mais severas para o Brasil do que apenas o encarecimento dos nossos produtos e a possível interrupção da corrente de comércio. Uma destas hipóteses — que se acontecer, deverá ser por uma escalada que ainda se pode evitar — é o desligamento do GPS no Brasil.
O GPS, que todos nos acostumamos a usar em aplicativos de orientação para motorista de automóveis, é um sistema proprietário dos Estados Unidos, que funciona por meio de satélites daquele país. A sigla é para Gobal Positioning System, ou sistema de posicionamento global. É uma tecnologia de origem militar que ganhou aplicação civil comercial. Ou seja, é um produto de alta sofisticação tecnológica em cima do qual diversos serviços foram desenvolvidos.
Se for da vontade do governo dos Estados Unidos, o Brasil pode ter os sinais do sistema GPS cortados. Se isso de fato vai acontecer, é outra discussão. Mas a mera possibilidade já levou o governo federal a criar um grupo de trabalho para iniciar estudos visando a criação de um equivalente nacional ao GPS. Aprovado este mês, o grupo está sob a coordenação do Gabinete de Segurança Institucional e tem 180 dias para entregar os primeiros estudos de viabilidade.
Estão envolvidos, além do GSI, os Ministérios da Ciência e Tecnologia, indústria Comércio e Serviços, Defesa, Comunicações, e o Comando da Aeronáutica, Anatel, Agência Espacial Brasileira, instituto Nacional de Pesquisas Espaciais, Telebras, Laboratório Nacional de Astrofísica, Finep, Centro de Gestão e Estudos Estratégicos, Associação das Indústrias Aeroespaciais do Brasil.
A criação do grupo, majoritariamente composto por entes governamentais, é uma iniciativa correta que só poderia partir do próprio Estado brasileiro. Ao fazê-lo, o Estado demonstra estar ciente das responsabilidades materiais que lhe competem. Acertadamente, temos em funcionamento um grupo de trabalho com as melhores mentes do país na questão aeroespacial. É mais um episódio que nos leva a concluir a importância do Estado e suas capacidades de planejamento para reduzir o grau de dependência tecnológica a que o Brasil se deixou submeter.
A louvável iniciativa deve apresentar seus resultados e receber estímulos para seguir adiante mesmo que o sinal do GPS proprietário dos EUA não seja cortado. Daí pode sair uma nova tecnologia brasileira que talvez até exceda as capacidades do sistema norte-americano, ao menos no que diz respeito às nossas próprias necessidades.
Os anos se passam e as evidências não deixam de indicar a importância do papel do Estado na construção de autonomia econômica e tecnológica dos países. É hora de o Brasil deixar de discutir apenas suas metas e regimes fiscais, e voltar a planejar o futuro com ambição. Os momentos de crise podem carregar consigo oportunidades igualmente dramáticas, como esta.